segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Mídia e política

Por João José de Oliveira Negrão

Grande parte do que sabemos sobre o mundo passa pela mídia. E muito de nossa maneira de ver o mundo – e, portanto, de agir nele – depende da mídia. Ela não transmite apenas “fatos”, mas também julgamentos, valores e interpretações.

A realidade que nos cerca não “existe” simplesmente – ela também é construída pela maneira de vê-la. Se até a realidade física não é simplesmente “captada” pelos nossos sentidos, mas reconstruída em nossas representações, mais ainda acontece com o mundo social. Assim, a representação que possuímos do mundo, e em especial do mundo social, é fruto das maneiras de vê-lo que criamos. As representações do mundo social são ativas: nós agimos no mundo de acordo com o que sabemos dele. A conservação ou a transformação da sociedade dependem, em grande parte, dessas representações.

A mídia é quase onipresente no nosso tempo: as notícias que vemos na TV, lemos na revista ou jornal, ouvimos no rádio são informações a que não teríamos acesso caso dependêssemos da observação direta ou do relato pessoal de algum participante.

Uma das funções mais importantes entre as desempenhadas pela imprensa é a chamada “formação da agenda pública” (agenda-setting) – isto é, a escolha das questões que vão mobilizar a opinião pública. A imprensa não se limita, porém, a agendar os temas públicos. Ela também exerce a função de “enquadramento”, pela qual as questões são colocadas dentro de determinados esquemas interpretativos. É o enquadramento que concede sentido a fatos que, de outra forma, pareceriam caóticos.

Para o bom funcionamento da democracia, é necessário que uma pluralidade de pontos de vista esteja presente na mídia. No entanto, a tendência do mercado é a concentração da propriedade.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 28-02-2011)

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Jornais impressos

Por João José de Oliveira Negrão

A Folha de S. Paulo, talvez hoje o principal jornal impresso do país, completou 90 anos. É um bom momento para uma reflexão sobre o veículo que, ainda, é o grande signo do jornalismo. Jornal impresso e jornalismo criaram, ao longo da história, uma simbiose de tal monta que se confundem. Mas há fortes indícios de que o impresso está em decadência. Não quero, com isso, praticar futurologia nem afirmar que dentro de pouco tempo não teremos mais jornais. Como toda instituição cultural e econômica da sociedade contemporânea, entre o início dos sinais de declínio e o efetivo fim, há um hiato de várias gerações.

Mas o presente dos jornais dá o que pensar. Nos últimos anos, por exemplo, tivemos no país um efetivo crescimento econômico. O consumo de uma variada gama de produtos se elevou significativamente. Mas mesmo neste cenário, com a chegada de milhões de brasileiros às classes C e B, as tiragens pouco se alteraram. O pouco que o meio jornal cresceu deveu-se mais à chegada ao mercado de novos títulos, gratuitos ou de preços ínfimos, do que ao crescimento sustentado dos veículos tradicionais. A própria aniversariante não chega a tirar 300 mil exemplares diários, o que é muito pouco levando-se em conta que a Folha é um jornal nacional num país de 200 milhões de habitantes. Seus concorrentes ficam abaixo disso.

Outro fato recente reforça a preocupação. Rupert Murdoch, o principal representante da mídia oligopolizada no mundo, lançou, há poucos dias, o diário The Daily, que só pode ser acessado pelos proprietários de tablets como o Ipad.

Estes novos suportes à notícia, muito mais ágeis e baratos, podem suplantar rapidamente a vantagem relativa que os impressos tinham sobre os meios eletrônicos: a possibilidade da prática de um jornalismo mais aprofundado e analítico. Tablets, smartphones e netbooks, de cômoda portabilidade e boa definição de leitura, já conseguem tirar esta vantagem e angariam novos leitores de maneira muito mais intensa que as velhas mídias.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 21/02/2011)

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

O fator Kassab

Por João José de Oliveira Negrão

O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, é o centro de intensa movimentação que pode alterar significativamente o mapa político de São Paulo e do Brasil. Se perder Kassab e, no mesmo embalo, o também recém eleito governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo, o PFL/DEM, que já foi o dono da maior bancada no Congresso Nacional, nos anos FHC, vira um partido de médio para pequeno. Isso porque estas duas lideranças conservadoras levarão consigo várias outras. Como exemplo, é provável que o vereador sorocabano e ex-deputado Caldini Crespo acompanhe Kassab.

No momento, o cenário não está plenamente definido. Kassab discute com o PMDB e com o PSB, duas legendas que compõem a base de apoio da presidenta Dilma. Outra possibilidade, que acho a mais forte por evitar qualquer problema de questionamento de mandatos, é a criação de um (mais um) novo partido, que já tem até nome: PDB, Partido da Democracia Brasileira.

Mas a força de atração de Kassab – o comando de um dos maiores orçamentos do país – também provoca estragos na frente de partidos que tradicionalmente se alia ao PT. Na cidade de São Paulo, o prefeito já trouxe para junto dele o PDT, o PSB e, recentemente, até o velho PCdoB, praticamente isolando o PT sozinho na oposição. Frente à movimentação do prefeito, de se deslocar da oposição para a base de apoio do governo federal, a direção municipal do Partido dos Trabalhadores divulgou nota, reafirmando a oposição ao governo Kassab na cidade de São Paulo.

Outra questão que se coloca é a perda de espaço paulatina das forças serristas dentro do PSDB. Neste sentido, um novo partido também pode interessar ao ex-governador José Serra, mentor e muito ligado a Kassab. Neste caso, a adesão à base de apoio dilmista pode ser apenas um canto de sereia.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp