segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

A privataria tucana


Por João José de Oliveira Negrão

A Privataria Tucana é o título do livro escrito pelo premiado jornalista Amaury Ribeiro Jr. (três prêmios Esso e quatro prêmios Vladimir Herzog de Direitos Humanos) e lançado no final da semana retrasada. Ele trata, principalmente, de negociatas e corrupção durante o grosso do processo de privatização das estatais brasileiras durante o governo FHC. E mira em José Serra, um dos pilotos deste processo, quando ministro do Planejamento. A filha, o genro e um primo do ex-governador, além do ex-tesoureiro de campanhas tucanas e ex-diretor internacional do Banco do Brasil, Ricardo Sérgio, sofrem pesadas e documentadas acusações. Só de documentos, o livro tem cem páginas.

Fenômeno de vendas, o livro teve sua primeira tiragem, de 15 mil exemplares, esgotada três dias após o lançamento e foi amplamente debatido nas redes sociais. Isso é um fato bastante raro na indústria editorial brasileira, superando best sellers antecedidos de intensa campanha de marketing. Estranhamente, no entanto, os grandes veículos oligopolizados da nossa comunicação simplesmente ignoraram o fato. Folha, Estadão, SBT, Band só foram tratar do assunto cinco ou seis dias após o acontecimento, quando a pressão e a cobrança na internet, contra a omissão, tornaram-se gritantes. As exceções foram a revista Carta Capital número 676, a única que tratou do assunto com a rapidez que merecia, e a Record News.

O mais interessante é a adoção de dois pesos e duas medidas pela nossa grande imprensa. Certas denúncias, quando envolvem membros do governo federal ou dos partidos aliados, são imediatamente trazidas a público, sem maiores cuidados de checagem e apuração. A revista favorável põe a denúncia na capa, o telejornal campeão de audiência cita a revista e o jornalão repercute o assunto. Quando envolvem, no entanto, tucanos paulistas, Serra, FHC ou o governo de São Paulo, todos eles são cheios de cuidados, exigem comprovações (que abundam, no caso do livro de Amaury Jr., em 100 páginas) e fazem questão de “ouvir o outro lado”. Mas ficam muito bravos quando se fala que eles não têm isenção.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 19/12/2011, com o título modificado pela redação para "Novo livro na praça" que, estranhamente, tem o mesmo número de caracteres)

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Liberdade: de imprensa ou de empresa?

Por João José de Oliveira Negrão

Na semana que passou, dois fatos ligados à comunicação mereceram destaque. Em primeira votação, o Senado aprovou, por 65 votos contra sete, a Proposta de Emenda à Constituição 033, que recria a necessidade de diploma universitário específico para o exercício da profissão de jornalista. A exigência, que vigorava desde 1969, foi derrubada pelo STF em 2009. Agora, a PEC será votada uma segunda vez, ainda no Senado Federal, e enviada para a Câmara dos Deputados.

O mesmo STF também começou a julgar um pedido, encaminhado pelo PTB, que acaba com a classificação indicativa, dispositivo que impede a exibição, em determinados horários, de programas de TV não indicados para crianças. A proposta já tinha quatro votos favoráveis, mas a sessão foi adiada, com pedido de vista feito pelo ministro Joaquim Barbosa e justificado pela necessidade de analisar mais detalhadamente a ação. Junto a Dias Toffoli, ministro relator da proposta, Luiz Fux, Cármen Lucia e Carlos Ayres Britto também votaram pelo fim da classificação indicativa.

Tanto em um caso quanto no outro, o STF acaba favorecendo o interesse explícito dos proprietários dos oligopólios da comunicação brasileira, em detrimento do conjunto da sociedade brasileira. Os argumentos chegam a ser pueris. Quanto aos jornalistas, o STF afirmou que a exigência de formação para o exercício profissional atentava contra a liberdade de expressão, o que não se sustenta, pois a lei nunca impediu que advogados, economistas, médicos, sindicalistas escrevessem artigos para jornais e revistas. Se não havia – e não há – pluralidade maior, é por vontade dos barões de nossa imprensa, não por uma questão profissional dos jornalistas.

Já no segundo caso, da classificação indicativa, conforme Renata Mieli, do Centro de Estudos Barão de Itararé, "sustentar, como fez o ministro Toffoli, mas também Carmen Lúcia e Ayres Britto, que não cabe ao Estado a tutela da família ou, como afirmou a ministra do STF, ‘se a programação não for adequada desliga-se a TV’, é uma forma de ratificar a visão dos concessionários públicos de radiodifusão de que a eles não cabe nenhuma responsabilidade pelo que é veiculado em uma concessão pública”.