quarta-feira, 31 de julho de 2013

Crise fabricada

João José Negrão

Boa parte do jornalismo econômico – em especial aquele praticado nas tevês – tem, de certa maneira, criado um clima de que a economia brasileira vai mal das pernas. Para isso, se apega a variações das bolsas de valores (que não refletem exclusivamente sintomas da economia nacional, mas também da economia europeia e norte-americana, que enfrentam problemas) ou amplifica dados irrelevantes, como a variação de 0,2% (isso mesmo) da taxa de desemprego comprada de junho de 2012 com junho de 2013. Era 5,8% no ano passado e chegou a 6%. Este índice, segundo diferentes economistas, significa pleno emprego.

Outros números mostram que há uma tentativa de fabricação de crise. O crédito imobiliário, no primeiro semestre de 2013, teve uma elevação de 34%, chegando a R$ 49,6 bilhões. Os dados são da Abecip (Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança). No mesmo período, os depósitos em poupança bateram o recorde histórico, com mais de R$ 28 bilhões positivos (depósitos menos saques), quase o dobro do recorde anterior, de 2012. Também a inadimplência de junho foi a menor registrada nos últimos 18 meses.

Também significativo é o crescimento dos investimentos publicitários. Segundo o Ibope Media, eles cresceram 19% neste primeiro semestre, saindo de R$ 43,84 bilhões em 2012 para R$ 52,03 bilhões agora. Quem é do meio sabe que, nos sinais de uma crise real, um dos primeiros investimentos cortados pelos empresários é a publicidade.

É hora de o nosso jornalismo econômico olhar mais a economia real, produtiva e parar de ouvir sempre as mesmas fontes ligadas ao mundo financeiro. O ex-ministro Maílson da Nóbrega, por exemplo, é uma destas figurinhas carimbadas. Parece que se esquecem que, com ele à frente da Economia, no governo Sarney, a inflação chegou a 89% ao mês.

João José de Oliveira Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 30/07/2013)

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Financiamento público

João José Negrão

Mais corrupção pesada. O Fantástico de domingo passado (13/7) mostrou uma operação da Polícia Federal, a Operação Apocalipse, que desvendou um esquema de traficantes de drogas com vereadores e deputados estaduais em Rondônia. A trama envolvia dinheiro para campanhas em troca de favores e cargos nas assessorias. Até um acordo registrado em cartório entre uma deputada e um traficante veio à tona. Certamente o envolvimento do crime organizado com o financiamento de campanhas políticas não se restringe a Rondônia.

O modelo atual de financiamento de campanhas é porta de entrada para estas distorções. Do jeito que é hoje, como cada candidato tem de buscar recursos para viabilizar os custos de sua campanha eleitoral, seja um concorrente ao Senado ou a uma câmara municipal, está aberto o caminho para práticas pouco recomendáveis, mas reais, da política brasileira. Os esquemas de caixa 2 – doação “por fora”, sem declaração à justiça eleitoral –, pelos mais diferentes motivos, estão presentes em cada uma de nossas seguidas eleições.

Esta porta tem de ser fechada. Para isso, é fundamental que a reforma política aprove o financiamento público exclusivo das campanhas eleitorais, sem a participação financeira de pessoas jurídicas e limitando drasticamente – ou mesmo proibindo – a de pessoas físicas. Para isso, no entanto, será fundamental, também, abandonar as candidaturas individuais e o voto nominal, assumindo o sistema de voto em lista fechada.

Tal medida, é claro, não consegue por si só eliminar de vez a corrupção. Mas fecha um caminho importante por meio do qual ela se insere nos canais institucionais do País.

João José de Oliveira Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 16/07/13)

Análise do voto em lista

João José Negrão

O sistema de voto que temos hoje no Brasil é o proporcional. Nele, primeiro se soma a quantidade de votos que cada partido ou coligação teve. Dessa forma se define o número de vagas a que eles terão direito. Isto feito, serão declarados eleitos os mais votados de cada partido ou coligação. Então, por exemplo, se um partido (ou coligação) tiver direito a 20 vagas, serão os 20 mais votados daquele partido (ou coligação) que assumirão os cargos. Assim, cada partido terá, nas câmaras legislativas, uma representação mais ou menos equivalente ao total de votos conquistados.

O sistema proporcional é, aqui, feito com a chamada lista aberta. Nele, cada partido pode lançar tantos candidatos quantos forem as vagas em disputa. Para deputado federal, em São Paulo, cada um pode ter até 70 candidatos. Se houver coligação, este número pode ser ainda maior. Com isso, o que vemos são diversos candidatos, do mesmo partido ou coligação, a garimpar votos em todas as regiões, disputando, inclusive, com seus colegas de partido. Na prática, temos campanhas individualizadas, não partidárias. Tal método encarece enormemente o processo eleitoral e abre espaço para práticas pouco ortodoxas de captação de recursos para as campanhas.

Outra possibilidade do sistema proporcional – que considero o mais adequado para o quadro multipartidário brasileiro – é o voto em lista preordenada. Nele, o eleitor não vota em nomes individuais, mas na lista de candidatos apresentada pelos partidos. A lista é predefinida nas convenções partidárias. Se o partido conquistar dez vagas, entram os dez primeiros; se só somar votos suficientes para uma vaga, entra o primeiro da lista.

O sistema proporcional com lista preordenada reforça os partidos, exige deles maior conteúdo programático e maior afinidade ideológica. Além disso, serve para acabar com as legendas de aluguel, que vivem de vender tempo de televisão e rádio entre uma eleição e outra. As campanhas serão muito mais baratas e – apenas neste caso – poderiam contar com financiamento público exclusivo, eliminando a prática do caixa 2.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 23/07/2013)

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Reformar a política

João José de Oliveira Negrão

A CUT, o PT e várias outras entidades dos movimentos sindicais e populares deram início à coleta de assinaturas para apresentar ao Congresso Nacional um projeto de iniciativa popular relativo à reforma política. Serão necessárias cerca de 1,5 milhão de assinaturas, acompanhadas de endereço e número do título de eleitor, para que ele possa ser apresentado e tramitar nas comissões das duas casas.

Segundo o texto do abaixo-assinado, o objetivo da proposta é alterar o sistema político eleitoral, instalando quatro medidas básicas: 1. Instituir o financiamento público exclusivo de campanhas eleitorais; 2. Voto em lista partidária preordenada (voto em lista fechada); 3. Aumento compulsório da participação feminina nas candidaturas; e 4. Convocação de Assembleia Constituinte exclusiva sobre a reforma política.

O financiamento público exclusivo ajuda a inibir a corrupção (a famosa caixa 2), reduz a influência do poder econômico e reduz os custos das campanhas. A lista preordenada, segundo a qual o eleitor vota no partido e não mais num candidato individual, garante a fidelidade partidária e pode ajudar a reduzir o peso das legendas de aluguel, além de contribuir, também, para o barateamento das campanhas. O aumento das candidaturas femininas vai colaborar para ampliar a democratização da representação política, enquanto a Assembleia Constituinte exclusiva poderá construir uma reforma política digna do nome, já que é difícil que a maioria dos parlamentares – beneficiária das práticas em vigor – queira modificar profundamente nosso sistema político.

As entidades estarão nas ruas, escolas e sindicatos para coletar as assinaturas. Os formulários podem ser encontrados, entre outros locais, em http://www.cutsp.org.br/noticias/Abaixo_assinado___Reforma_Politica.pdf

João José de Oliveira Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no CEUNSP

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 21/05/13)

Democracia na Comunicação

João José de Oliveira Negrão

Na semana passada, tratei aqui neste espaço da coleta de assinaturas que está sendo feita para a Lei de Iniciativa Popular que trata da reforma política. Hoje, vou tratar de proposta parecida, o projeto de Lei de Inciativa Popular da Mídia Democrática. A possibilidade deste tipo de projetos de lei é um dos maiores avanços democráticos advindos da Constituição de 1988.

Não haverá ampliação da democracia se não conseguirmos democratizar a comunicação no Brasil. Segundo o estudo Donos da Mídia há, no país, 41 grupos que controlam 551 veículos e 70% das informações que a nossa mídia divulga estão concentradas nas mãos de apenas seis famílias, que controlam os grandes oligopólios da comunicação. No caso da TV, conforme dados de 2010, a Globo controla 342 emissoras e retransmissoras; o SBT, 195; a Band, 166; e a Record, 142. Estes conglomerados – ao lado de alguns outros, como a Abril, o Estado de S. Paulo e a Folha de S. Paulo – se ramificam em jornais, rádios, revistas e portais.

Por isso, o projeto que as entidades que promovem a coleta de assinaturas defendem destaca pontos como a necessidade da regulamentação do capítulo relativo à Comunicação da Constituição de 1988, em bases que garantam a liberdade de expressão e a diversidade de ideias; a democracia, ao impedir que políticos sejam donos de emissoras de rádio e TV; a diversidade e o emprego, ao garantir a produção de conteúdos regionais; e a pluralidade, ao combater o monopólio e impedir a propriedade cruzada (numa cidade ou região, o mesmo grupo fica impedido de possuir emissoras de TV, rádios, jornais, revistas e portais), estimular a competição no setor privado e garantir a existência de 33% de canais públicos.

O abaixo-assinado pode ser encontrado em www.cutsp.org.br

João José de Oliveira Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no CEUNSP

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 28/05/13)

Europa em crise

João José de Oliveira Negrão

Os números são assustadores. A taxa de desemprego na zona do euro (os 17 países europeus que usam a moeda comum) chegou a 12,2% e não dá sinais de arrefecimento. O mais grave, no entanto, é que a falta de trabalho atinge particularmente os jovens: cerca de um quarto (ou 25%) das pessoas até 25 anos está desempregada. Os números indicam uma acentuada fratura social em países como Grécia, Espanha e Portugal. A primeira, com uma taxa geral de desemprego de 27%, tem 62,5% de seus jovens sem trabalho; na Espanha, o desemprego geral chega a 26,8%, mas atinge 56,4% dos jovens; Portugal tem 18% de sua população desempregada.
A própria Suécia, um dos exemplos mais bem sucedidos de Welfare State (Estado de Bem Estar Social), ao optar pela introdução de mecanismos neoliberais (ou de austeridade) em sua economia, está vendo crescerem as manifestações de rua, dos crescentemente excluídos. O primeiro ministro Fredrik Reinfeldt, do Partido dos Moderados (ex-Partido da Direita), já está há sete anos no governo, reduzindo subsídios ao bem-estar popular e baixando os impostos para os mais ricos. Ele conseguiu que a Suécia seja o país da OCDE onde ocorreu o maior crescimento da desigualdade. Reinfeldt chama os manifestantes desempregados de vândalos.
Na contramão da crise mundial, o Brasil – assim como outras nações que resolveram romper com o modelo neoliberal das grandes instituições econômicas mundiais – vive um momento singular em sua história, com pleno emprego e redistribuição de renda. Estes países são a prova viva de que as políticas de austeridade monetária e fiscal, aquelas que o Banco Central Europeu insiste em aplicar mesmo levando determinados países à bancarrota social, aumentam a distância entre ricos e pobres e cindem a sociedade, no interesse de poucos muito ricos.

João José de Oliveira Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no CEUNSP

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 04/06/13)

Crise dos jornais e revistas

João José de Oliveira Negrão

Na última década, a economia brasileira cresceu. Talvez menos do que o esperado, mas cresceu. O consumo de pessoas e famílias, alavancado pelo crescimento do emprego e da massa salarial, chegou a níveis jamais alcançados anteriormente. Centenas de produtos, de eletroeletrônicos a iogurtes, de veículos a roupas, de computadores e tablets a frango e carne bovina, passaram a ser comprados no mercado interno brasileiro. Economistas afirmam que foi o mercado interno quem evitou que o Brasil fosse assolado pela grave crise financeira que abala boa parte da economia capitalista mundial.
Há um produto, no entanto, que não teve crescimento: jornais e revistas, especialmente os títulos da chamada grande imprensa, têm hoje tiragens menores que há uma ou duas décadas. Ou seja, vendem menos numa situação na qual a capacidade de consumo do brasileiro médio se elevou.
Os sinais de crise são evidentes: reestruturação, fechamento de revistas e demissões na Editora Abril; extinção de cadernos, jornal menor e demissões na Folha de S. Paulo; fim do Jornal da Tarde, reestruturação e demissões no Estadão; demissões no Valor, jornal cuja propriedade é dos grupos Folha e Globo. Mesmo a rede Bom Dia se reestruturou e cortou seu quadro de jornalistas e outros funcionários.
A raiz desta crise é dupla. De um lado, a mídia tradicional é acossada pelas novas plataformas de dados e informações. Menos gente parece disposta a comprar notícias que pode ter gratuitamente pela internet. De outro, a maior parte dos jornais e revistas mostra-se pouco criativa em relação às pautas, insiste num discurso conservador, envelhecido e panfletário contra os avanços sociais no Brasil e em outros países da América Latina e não se mostra capaz de agregar ao seu universo de leitores a massa de jovens com maior grau de instrução que o Brasil produziu nos últimos anos.

João José de Oliveira Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no CEUNSP

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 11/06/13)

Jornalismo e protestos

João José Negrão

Não deixou de ser impressionante a fúria com que a PM investiu contra jornalistas nos protestos da semana que passou. Não que baixar o cacete nos outros pode, desde que se preservem os jornalistas. Não vai aqui nenhuma defesa corporativa. Mas profissionais foram presos, detidos e vítimas de agressões e balas de borracha que, ao que tudo indica, cegaram um repórter-fotográfico e quase deixaram sem visão uma repórter. Ao todo, foram 15 os jornalistas que, de alguma maneira, sofreram violências.
Muitos falaram em falta de preparo da PM para lidar com protestos na democracia. Mas eu temo que ela venha sendo preparada para agir, durante manifestações, exatamente desta forma, comportando-se mais como uma guarda pretoriana do governador Geraldo Alckmin do que um braço do Estado voltado à defesa da segurança dos cidadãos. A polícia – que tem cadeia de comando, no topo colocando-se o governador de estado –, não agiu de forma truculenta e excessiva apenas nos protestos recentes. A mesma prática foi adotada na desocupação do Pinheirinho, em assembleias e manifestações de professores, etc. Não dá para esquecer que, há poucos anos, quase tivemos um conflito armado de proporções incalculáveis, quando a PM foi deslocada para reprimir uma manifestação de policiais civis em greve.
Mas qual terá sido o interesse em agredir os jornalistas? Se não podemos entrar em paranoicas teorias da conspiração, também não dá para achar que foi mera coincidência. Houve atos deliberados, como a tentativa de atropelamento de um fotógrafo do Estadão. A fotografia de um policial quebrando vidros de uma viatura teve uma explicação pueril por parte do comando. Vamos torcer para que o aparelho de Estado não esteja se utilizando de agentes provocadores para justificar repressão e mostrar “pulso forte”.

João José Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no CEUNSP

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 18/06/13)

Voto distrital é opção ruim

João José Negrão
No sistema de voto distrital, o Brasil seria dividido em diferentes distritos e cada um elegeria apenas um representante. Para os defensores, a principal vantagem do voto distrital é o maior controle do representado sobre o representante. Mas há problemas: como dividir o país em distritos. Quantos seriam? Hoje, temos 513 deputados federais e, se adotarmos uma aritmética simples, o Brasil seria dividido em igual número de distritos. Como temos perto de 150 milhões de eleitores, cada um teria cerca de 292 mil eleitores. Quantos distritos teria a cidade de São Paulo? E os estados de Roraima ou Amapá?
Outro problema é a paroquialização das eleições nacionais. Por este sistema, cada distrito elege apenas um representante. Por isso, o candidato e, depois, o eleito, tende a preocupar-se quase exclusivamente com os assuntos específicos de seu distrito (pode ser um conjunto de pequenas cidades ou um conjunto de bairros, nas maiores). Deste ponto de vista, ele seria quase um vereador federal. Num país com as dimensões do Brasil, as grandes questões nacionais, como a política externa, os blocos regionais, a universidade pública, entre outras, correriam o risco de ser secundarizadas.
O voto distrital também tende a excluir a representação de forças políticas. No sistema proporcional – como o que temos hoje – um partido que tenha 20% dos votos distribuídos nacionalmente, terá mais ou menos essa representação na Câmara dos Deputados; no sistema distrital, provavelmente não teria representação alguma. Nesse sentido, o voto distrital é menos democrático que o voto proporcional. Se tivéssemos este sistema no passado recente, grandes nomes da política, como Ulysses Guimarães e Florestan Fernandes – que tinham votos espalhados no estado inteiro, não apenas em uma região determinada – teriam ficado de fora da constituinte de 1988.

João José Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no CEUNSP

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 09/07/13)

Movimento em disputa

João José Negrão

O atual movimento que tomou conta das ruas no Brasil é interessante sob vários aspectos. É um movimento com características novas, especialmente no que diz respeito ao seu processo de mobilização, fortemente centrada nas redes sociais. Há vários elementos sociológicos que se entrecruzam na tentativa de compreensão do que, afinal, ele significa. Evidentemente, uma análise assim, a quente, enquanto tudo está acontecendo, é cercada de riscos e possibilidades de engano, pois ainda não temos o distanciamento necessário para uma avaliação mais segura. No entanto, alguns pontos podem ser destacados:
1. Há claramente um elemento de catarse. Parcela da juventude parece que se cansou das cobranças das gerações anteriores sobre sua despolitização, falta de participação, e resolveu mostrar que também vai às ruas protestar
2. Várias das reivindicações e palavras de ordem são contraditórias entre si. Ao lado de proposições justas e progressistas, como a redução dos preços das tarifas e a melhoria da qualidade dos transportes públicos, surgem outras, meio de contrabando, que mostram uma tentativa das forças conservadoras e de Direita de surfar na onda do movimento, uma vez que, pelas suas próprias capacidades e bandeiras, elas não conseguem mobilizar a população. Esta contradição é típica de movimentos que abarcam muitos setores médios. Caso se fortaleça, dentro do movimento, a ideia de que ele é “contra tudo que está aí”, sem objetivos específicos e reivindicações mais concretas, ele corre o risco de ser a versão brasileira do movimento dos indignados da Europa, que, justamente por estas características, acabou levando de volta aos governos os partidos conservadores e de Direita, como o PP espanhol, que aplicou medidas antipopulares e antidemocráticas, de arrocho, de desemprego e de redução de gastos sociais na tentativa de debelar a crise econômica causada justamente pelas políticas conservadoras e neoliberais.
3. Uma das principais forças, o Movimento do Passe Livre, não é conservador nem de Direita. Vi diferentes entrevistas de algumas de suas lideranças e elas me pareceram ter bastante clareza. Mas será preciso afastar do movimento tendências antidemocráticas e que beiram o fascismo, como a tentativa de proibir e expulsar das manifestações as bandeiras dos partidos, quaisquer que sejam eles. Além disso, se afastar, de forma clara, dos provocadores (inclusive grupúsculos neonazistas), que querem o retrocesso, não o avanço da democracia tão duramente conquistada.
4. Penso que as forças democráticas e progressistas não devem temer nem repudiar o movimento, mas sim interagir com ele. Há nele um núcleo que quer aprofundar a democracia e ampliar as conquistas populares. Ficar de fora, de longe, simplesmente criticando porque há tendências contraditórias e forças de Direita querendo tirar proveito pode, justamente, jogar parcelas do movimento no colo da reação.

João José de Oliveira Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no CEUNSP

(Publicado em duas partes no Bom Dia Sorocaba de 25/06 e 02/07/13)