terça-feira, 27 de agosto de 2013

Brasil precisa de médicos

João José Negrão

A chegada de médicos estrangeiros para trabalhar no Brasil – especialmente os cubanos – tem gerado uma discussão ideológica anacrônica, típica da Guerra Fria, que gera muito mais luz do que calor. Nas redes sociais, pipocam “análises” ultraconservadoras alertando sobre a “infiltração comunista” no país. Ao mesmo tempo, defende-se os médicos cubanos contra o “trabalho escravo”. Quer dizer, os “agentes” são, ao mesmo tempo, pobres coitados que precisam ser defendidos.

Mas a questão é objetiva: médicos brasileiros se recusam a assumir certos postos de trabalho. Aqui mesmo, em Sorocaba – que nem mesmo o mais insensato membro da oposição local chamaria de “grotão” –, vários concursos realizados pela Prefeitura não tiveram suas vagas preenchidas, por falta de interesse dos aprovados em assumir os postos.

O sofisma é grande. Diferentes organizações médicas ora afirmam que os salários são baixos (o que nem sempre é verdadeiro), ora dizem que não há estrutura (como se postos de atendimento primário tivessem de ser superequipados). Também criticam a “má-formação” dos médicos estrangeiros. O paradoxo é que um dos líderes da resistência à contratação dos estrangeiros, o presidente do Sindicato dos Médicos do RS, teve seus dois filhos formados em Cuba, que tem, neste momento, mais de 17 mil médicos trabalhando em diferentes países.

O dado real é que há centenas de cidades e bairros periféricos sem médicos, cuja população é tão portadora de direitos quanto qualquer morador dos grandes centros. Por isso, quem precisa mesmo de médicos, quem não suporta mais ter de se deslocar por quilômetros e esperar meses por uma consulta, considera bem-vindos os estrangeiros.

João José de Oliveira Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp e na Pós-Graduação em Jornalismo da PUC-SP

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 27/08/2013)

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Jornal impresso em queda

João José Negrão

A Fundação Perseu Abramo apresentou na última sexta-feira (16) o resultado de uma pesquisa realizada com 2.400 pessoas acima dos 16 anos, que vivem em áreas urbanas e rurais de 120 municípios distribuídos nas cinco regiões do Brasil. Alguns dados mostram a velocidade da mudança de hábitos culturais – pelo menos no aspecto relativo à informação: a Internet vem ganhando a preferência da população como veículo para se informar sobre a cidade, o Brasil e o mundo e já empata (ambos têm 43%) com os jornais impressos, em meio habitual de informação.

Sobre a televisão, há desconhecimentos: a maioria dos entrevistados não sabe que os canais são concessão pública. “Para 60% são empresas de propriedade privada, como qualquer outro negócio”, acrescentou, durante a apresentação, o sociólogo Gustavo Venturi, coordenador da pesquisa. “Mesmo assim, 71% da população são favoráveis a que haja mais regras para se definir a programação veiculada”, destacou.

Outros elementos permitem afirmar esta mudança de paradigma. Nos últimos anos, houve a ascensão da chamada classe C e o consumo da quase totalidade dos produtos – de iogurte a frango, de automóveis a tevês de plasma e computadores. Mas a tiragem dos grandes jornais e revistas brasileiros não acompanhou tal movimento. Pelo contrário, tem hoje menos exemplares em circulação que há 20 ou 30 anos.

Assim, é possível afirmar que o jornalismo impresso encontra-se em uma encruzilhada: se não achar um modo de se firmar, vai perder cada vez mais importância como elemento significativo na conformação da opinião pública e da cultura no país. Particularmente, não creio que o processo já desencadeado se reverterá.

João José de Oliveira Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp e na Pós-Graduação em Jornalismo da PUC-SP

(Publicado no Bom Dia Sorocaba em 20/08/2013)

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Fim da História durou pouco

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Poder Judiciário quer punir sociólogo

João José Negrão

Conheci o professor e cientista político Aldo Fornazieri no início dos anos 90, quando fiz pós-graduação em Política na Escola de Sociologia e Política de São Paulo. Hoje, Aldo é diretor da instituição. No final de agosto, ele deu uma entrevista ao Estadão – jornal onde também costuma colaborar com artigos e análises – com críticas ao Poder Judiciário, “tão corrupto quanto os outros dois poderes”, disse Fornazieri.  O cientista político citou o caso específico do Tribunal de Justiça de SP, “envolvido com denúncias fortes, divulgadas na semana passada [retrasada], sobre o pagamento de benesses indevidas, com desvio de milhões de reais”. Fornazieri frisou ainda que “os escândalos do Judiciário não têm tanto destaque na mídia quanto os do Legislativo e do Executivo”.

É importante destacar que Aldo não fez acusações a ninguém, apenas se apoiou, em sua análise, em matérias divulgadas pelos jornais, inclusive o Estadão, a quem ele estava falando. Pois bem, qual foi a atitude do Presidente do Tribunal de Justiça de SP, desembargador Ivan Sartori? Interpelar judicialmente o professor e o jornal. Segundo Sartori, Aldo também será alvo de queixa-crime.

O fato só reforça a necessidade que o país tem de mais transparência nas suas instituições. E a certeza de que o Judiciário é o poder mais opaco da nossa República, com poucos, ou nenhum, mecanismos de controle externo. No Executivo e no Legislativo, bem ou mal, os detentores se submetem ao voto popular, que pode ou não permitir que eles continuem. No Judiciário, o único controle é o exercido pelo Conselho Nacional de Justiça, um órgão de autorregulação, pois é composto exclusivamente por integrantes do próprio Judiciário.

O Brasil avançou, nas últimas décadas, em questões sociais, econômicas e políticas. Nossa democracia, cada vez mais consolidada, não pode mais conviver com poderes de Estado autorreferentes. É preciso ampliar a transparência do Judiciário.

João José de Oliveira Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 06/08/13)