terça-feira, 19 de maio de 2009

A evolução dos cursos de Jornalismo

Por João José de Oliveira Negrão

Quando foram criados os cursos de Jornalismo em 1947, através de um convênio entre a Fundação Cásper Líbero e a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São Bento (PUC-SP), e em 1948, na então Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro, a área possuía relativa autonomia, embora próxima aos cursos de Filosofia.

Os primeiros cursos integram o que Marques de Melo chama de corrente ético-social, com inclinação para as questões de natureza deontológica. Os primeiros professores de Jornalismo eram quase exclusivamente bacharéis de Direito, o que explica esta opção.

O golpe militar marca a passagem do momento ético-social para a corrente técnica-editorial, mais voltada para a técnica jornalística. O processo de modernização econômica nas empresas de comunicação, aliado às dificuldades impostas pela ditadura ao exercício da liberdade de imprensa, explica este novo momento.

No final dos anos 70, ainda conforme Marques de Melo, começam a vir a público as primeiras dissertações de mestrado das pós-graduações pioneiras na área. Essa fase vai ser marcada pelas reflexões sobre a Indústria Cultural, configurando a corrente político-ideológica, sob forte influência dos frankfurtianos.

Por último, o autor identifica a corrente crítico-profissional, que “abandona conscientemente aquela postura subalterna de tentar enfocar o Jornalismo sempre a partir de parâmetros construídos por outras ciências e disciplinas” e busca construir uma identidade do Jornalismo que “implica utilizar o arsenal metodológico alicerçado pelas ciências humanas (e não apenas uma ciência em particular) para traçar os contornos da profissão e resgatar todas as suas dimensões sociais e políticas”.

A partir destes pressupostos, penso que é hora de repensar aquela autonomia inicial, sob novas condições.

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 18/05/09)

Terceira audiência pública sobre as diretrizes para Jornalismo


Por Rogério Christofoletti

Reproduzo o relato publicado pelo jornalista e professor Rogério Christofoletti, no blog http://monitorando.wordpress.com, sobre a terceira audiência pública da comissão que está debatendo as novas diretrizes curriculares para os cursos de Jornalismo. O encontro aconteceu dia 18/05/09, na sede da OAB, em São Paulo. (João José de Oliveira Negrão)

A comissão de especialistas que trabalha na reforma das diretrizes curriculares dos cursos de Jornalismo concluiu ontem a etapa das audiências públicas que realizou com variados setores da sociedade. A terceira e última audiência aconteceu na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em São Paulo, e reuniu representantes de diversas organizações. “Foi a reunião mais densa e orgânica que tivemos”, avaliou o presidente da comissão, José Marques de Melo, após quase quatro horas de debates. “As duas audiências anteriores também foram bastante participativas, mas hoje a diversidade das falas enriqueceu bastante o processo”.

Marques de Melo se referia às quase trinta organizações presentes, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj) a Unesco e Instituto Ethos, passando pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação (Enecos) e Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI).
As manifestações das organizações, e as sugestões da platéia foram recolhidas pela comissão, que já iniciou a sistematização das informações para a redação de um documento que se pretende resultar no das novas diretrizes. Se antes o prazo de conclusão dos trabalhos era 3 de junho, agora estendeu-se até 12 de agosto, informou a representante do Ministério da Educação Cleonice Matos Henn.

Formação humanística

Não apenas entre as entidades participantes, mas também entre convidados, um tema foi repetido quase à exaustão durante a audiência: a necessidade de reforçar a formação humanística nos cursos de Jornalismo. Foi o caso dos jornalistas Caio Tulio Costa e Eugenio Bucci, que abriram a sessão de manifestações. Para eles – cada um a seu modo -, as escolas precisam retomar conteúdos que contribuam para uma formação mais clássica dos jornalistas, de modo a não apenas se capacitarem a executar tarefas práticas e cotidianas da profissão. “A formação do profissional multimídia não pode acontecer afastada de uma formação humanística”, afirmou Caio Tulio.

Eugenio Bucci criticou a organização atual das disciplinas nos currículos – jornalismo impresso, televisivo, etc… -, argumentando que essa disposição já não mais dá conta das demandas formativas. O professor de Ética da USP citou eixos que poderiam sustentar uma formação ideal na sua visão: Linguagem, Democracia, Formação Humanística e Formação em Teorias da Comunicação. Os conteúdos relevantes para formar novos jornalistas perpassariam esses eixos de forma mais fluida e sistêmica.

Curso complementar ou não?

Outro tema palpitante na audiência foi a própria natureza e modalidade dos cursos de Jornalismo a serem oferecidos no Brasil. Caio Tulio Costa, por exemplo, defendeu a proposta de profissionais formados em outros cursos fazerem especialização nas escolas de Jornalismo, habilitando-se a atuar nas redações. A proposta foi referendada por outras falas, entre as quais a da CNBB. Mas teve resistência bem marcada nas posições de Celso Schroeder, coordenador do FNDC, e de Valci Zuculoto, do Departamento de Educação e Aperfeiçoamento Profissional da Fenaj, que argumentaram pela garantia de formação específica em Jornalismo, e não a sua complementar.

Bem menos ligados à academia, alguns setores demonstraram forte preocupação quanto a oferta de cursos no país. Eduardo Ribeiro, da Mega Comunicação, comparou números de escolas e de egressos à tendência cada vez mais aguda de fechamento de postos de trabalho, e a consequente não absorção de grandes contingentes de recém-formados. Sérgio Gomes, da Oboré Comunicação, queixou-se da impossibilidade real de conciliar os conteúdos e competências desejáveis aos novos jornalistas com as condições encontradas nas escolas e na vida contemporânea.

Dispersão e resultados

A audiência de ontem foi comemorada pelo presidente da comissão, José Marques de Melo, como um momento de diversidade e encontro de pensamentos distintos no debate sobre as diretrizes curriculares. A pluralidade das organizações presentes e a possibilidade de manifestações livres enriquece, mas também fragmenta a discussão.

Nas quase quatro horas de audiência, falou-se de tudo: dos conteúdos desejáveis nos currículos à necessidade de maior fiscalização do MEC sobre os cursos; da urgência da democratização da comunicação ao papel central da ética na formação dos jornalistas. Houve até quem se perdesse, como o representante da ONG Amigos da Água que, em tom alarmante, falou da extinção da humanidade por causa da escassez do recurso; ou ainda como um angustiado repórter fotográfico, que se queixou de como o sindicato dos jornalistas vem permitindo a entrada de profissionais totalmente despreparados no mercado de trabalho.

Audiência públicas são relevantes, mas também são um perigo, pois podem descambar para um festival de catarses ideológicas, de reclamações descabidas e inoportunas, e de outros desvarios. Não foi o caso de ontem, talvez até pelo adiantado da hora e do cansaço evidente de todos.
Audiências como esta têm muito mais significado político do que prático e operacional. Nessas ocasiões, as organizações têm a liberdade de se manifestar e marcar posições, ancorando seus discursos em plataformas mais evidentes. Do ponto de vista prático, a comissão de especialistas teve a oportunidade de recolher contribuições, referendou o processo de debate público e concluiu uma importante etapa em seus trabalhos: ouvir os setores interessados e receber informações e sugestões.

A partir de agora, a comissão deve trabalhar em cima de uma massa considerável de dados, precisando inclusive tomar algumas decisões que venham a orientar o documento que será encaminhado ao MEC. Esse documento ainda não é o que sintetiza as diretrizes curriculares, já que é preciso que o Conselho Nacional de Educação analise e edite essas normativas. Como disse José Marques de Melo no final da audiência de ontem, não se deve alimentar ilusões de que o caminho esteja no final e ele seja tranquilo. De nada adianta termos diretrizes curriculares bem construídas se a sociedade não fazê-las acontecer. Marques de Melo sabe do que está falando e há muito chão pela frente…

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Entidades sindicais dos jornalistas criticam relatório da OEA

Repercutiu negativamente entre as entidades sindicais dos jornalistas o relatório da Divisão Especial para Liberdade de Expressão da Organização dos Estados Americanos (OEA), divulgado na semana passada. Além de relatar casos de agressão à liberdade de expressão no Brasil em 2008, a relatoria posicionou-se contra a exigência do diploma para o exercício da profissão no País.

Na página 41 do relatório, é mencionado o processo em curso no Supremo Tribunal Federal e a informação equivocada de que o Decreto Lei 972/69, que regulamenta a profissão de jornalista, “regulamenta a Lei de Imprensa”. O registro se sustenta em informações da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) e em matéria publicada pelo site Congresso em Foco no dia 21 de outubro de 2008, “A Relatoria Especial recorda ao Estado que, de conformidade com a jurisprudência da Corte Interamericana, este tipo de requisitos constitui uma restrição à liberdade de expressão incompatível com o artigo 13 da Convenção Americana”, diz o relatório, referindo-se à exigência do diploma para o exercício do Jornalismo.

Para o presidente da Federação dos Jornalistas da América Latina e Caribe (Fepalc) e 1º vice-presidente da FENAJ, Celso Schröder, uma das falhas do relatório é não apontar que as restrições à liberdade de expressão no Brasil ocorrem principalmente pela influência dos poderes político e econômico sobre os meios de comunicação. “Já no ano passado formalizamos a crítica, em Washington, de que a OEA silencia sobre o processo de concentração da propriedade da mídia no Brasil - esta sim uma violação da liberdade de expressão - e acaba se transformando em tribunal de exceção, violando o princípio da soberania, sem o direito ao contraditório”, diz.

Schröder estranha, também a aproximação da posição da OEA com as bandeiras históricas da SIP, que combate sistematicamente o direito à livre organização e colegiamento dos jornalistas em toda a América Latina. “E não é demais lembrar que as duas entidades se omitiram ou apoiaram abertamente as ditaduras nas décadas de 60 e 70”, ressalta.

Já o presidente da FENAJ, Sérgio Murillo de Andrade, põe em dúvida se é “ingenuidade ou distorção deliberada” a confusão que normalmente é feita em relatórios similares sobre a regulamentação profissional dos jornalistas brasileiros, a liberdade de expressão e o direito da sociedade à informação. “É absurda a confusão que se quer fazer entre cerceamento à liberdade de expressão com o direito dos jornalistas terem uma regulamentação profissional que exija o mínimo de qualificação”, protesta. Ele lembra que no Brasil qualquer pessoa pode expor seu conhecimento e que prova disso são os artigos de profissionais de diversas outras áreas que estão na mídia diariamente. “Agora, se o dono do veículo não publica determinados fatos ou posições porque é contra, a culpa não é do diploma”, lembra.

Para Murillo, ser contra o diploma significa favorecer o poder desmedido dos proprietários das empresas de comunicação. “Sem o requisito do diploma, o que teríamos seria uma sociedade ainda mais distante das condições ideais de acesso à informação de qualidade, ética e pluralista, em função do monopólio dos meios de comunicação”, avalia. Ele acredita, no entanto, que isso não ocorrerá, baseado no julgamento unânime do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, ocorrido em 2005, de que a exigência do diploma para o exercício da profissão não é inconstitucional.

(Publicado originalmente no boletim da Fenaj)