terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Distorções do voto distrital

Por João José de Oliveira Negrão

Na semana passada, levantei problemas do sistema de voto distrital, que tem defensores numa necessária reforma política: como definir o tamanho de cada distrito (unidade eleitoral que escolhe apenas um candidato) evitando o aumento na distorção da representatividade que hoje já existe? Mostrei que pode acontecer de um deputado federal paulista representar 571.500 habitantes enquanto um de Roraima representaria 52.750.

Além destes números, o voto distrital puro pode trazer o hiperlocalismo das eleições nacionais. Por este sistema, cada distrito elege apenas um representante. Por isso, o eleito, tende a preocupar-se quase exclusivamente com os assuntos específicos de seu distrito (pode ser um conjunto de pequenas cidades ou um conjunto de bairros, nas maiores), transformando-se quase num vereador federal. As grandes questões nacionais, como a política externa, os blocos regionais, a universidade pública, entre outras, correriam o risco de ser secundarizadas no Parlamento e ficar a cargo exclusivo do Executivo.

O sistema distrital também tende a excluir a representação de forças políticas. No sistema proporcional – como o que temos hoje – um partido que tenha 20% dos votos distribuídos nacionalmente, terá, mais ou menos, essa representação na Câmara dos Deputados; no sistema distrital, provavelmente não teria representação alguma.

De maneira geral, nos países onde vigora o voto distrital puro, a tendência é a do bipartidarismo (apenas dois partidos disputam, para valer, as eleições). No Brasil, bipartidarismo lembra dos tempos da ditadura militar, com apenas Arena e MDB. Países que adotam o sistema, como a Inglaterra – onde surgiu uma terceira força importante, o Partido Liberal Democrata, ante os anteriores partidos Conservador e o Trabalhista –, estudam modificá-lo e adotar o sistema proporcional. Voltaremos ao tema.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 20/12/2010)

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Voto distrital puro

Por João José de Oliveira Negrão

A necessidade da reforma política e, consequentemente, do sistema eleitoral, volta à discussão. Neste cenário, surgem propostas já experimentadas em outros países, como é o caso do voto distrital puro, defendido por atores de diferentes partidos. Esta engenharia institucional funciona da seguinte forma, no caso de eleição nacional: o Brasil seria divido em vários “distritos eleitorais” (que não obrigatoriamente seguiriam as divisões geográficas entre as cidades) e cada um deles elegeria um deputado federal. As eleições estaduais e municipais seguem a mesma lógica, mas os distritos eleitorais podem ser outros.

A principal vantagem alegada pelos defensores do sistema é a “proximidade” entre o eleito e os eleitores. Mas há problemas graves na montagem da estrutura. Certamente ninguém proporia um aumento no número de deputados federais. Assim, ficaríamos com os 513 que temos hoje. Vamos supor que sejamos 200 milhões de habitantes, para trabalhar com números redondos. Cada parlamentar representa, então, cerca de 390 mil brasileiros. Seria esta a delimitação de cada distrito eleitoral? Se for, várias cidades terão de se juntar para compor um distrito eleitoral.

Neste caso, São Paulo, com 40 milhões de habitantes, teria 102 distritos e, portanto, 102 deputados; Rondônia, com 1.560.000, seria dividida em quatro distritos e teria quatro parlamentares. E Roraima, com pouco mais de 420 mil moradores, teria apenas um.

Outra possibilidade seria manter a atual representação parlamentar por estado, que implica continuar com a subrepresentação dos mais populosos. SP, com 70 federais no total, tem um deputado para cada grupo de 571.500 habitantes. Rondônia, com oito deputados federais – o mínimo -- teria um por grupo de 195 mil moradores, enquanto Roraima, com os mesmos oito, teria um por grupo de 52.750, quase dez vezes menos que São Paulo. A distorção é evidente.

Nos próximos artigos, voltarei ao tema e tentarei explicar as outras possibilidades, como o voto distrital misto e o voto em lista fechada.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 13-12-2010)

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Jornalismo e transparência

Por João José de Oliveira Negrão

Dois fatos bem recentes recolocam com força a ideia de que o jornalismo – enquanto fenômeno social – está passando por uma revolução sem precedentes. E o termo é este mesmo: revolução, pois as mudanças não são simplesmente cosméticas, mas institucionais e de paradigmas. Tudo isso tendo por pano de fundo as redes sociais e a internet, que, como suporte tecnológico, contribuem para a emersão de novas relações sociais, que já se vinham desenhando há algum tempo no universo da comunicação social.

O WikiLeaks, site editado por Julian Assange, pautou todos os grandes veículos mundiais ao tornar públicos mais de 250 mil documentos diplomáticos da inteligência dos EUA. Já tinha feito isto antes, quando publicizou documentos sobre a guerra do Iraque. Assange está pagando um preço caro pela audácia: diferentes países têm pressionado os servidores que suportam o WikiLeaks a negarem o acesso à rede mundial. Na semana que passou, o site chegou a ficar algumas horas fora do ar.

Outro fato interessante, na linha desta transformação, foi a força que teve o twitter @avozdacomunidade durante as operações do estado brasileiro contra o tráfico de drogas no Rio de Janeiro. Operado por garotos (o mais velho com 17 anos), ele contou, pelo lado de dentro das favelas, cada detalhe da tomada da área pelas forças de segurança. Os relatos, curtos como exige o Twitter (até 140 caracteres), poderiam ser caracterizados como puro jornalismo informativo.

Esta mudança não é só no jornalismo, pois implica em alterações significativas no conceito de segredo de Estado. Um dos maiores teóricos contemporâneos da democracia, o italiano Norberto Bobbio, já escreveu que uma das “promessas não cumpridas” do regime democrático é a plena transparência dos atos dos governos e dos estados. Talvez estejamos vendo o limiar do tempo em que tal promessa não poderá mais deixar de ser cumprida.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 06/12/2010)

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Ressentidos

Por João José de Oliveira Negrão

Passadas as eleições presidenciais, manda a boa tradição democrática que forças de oposição e de situação absorvam a decisão popular e se preparem para um próximo período. Setores ou figuras públicas que apoiaram o ex-candidato José Serra, no entanto, não têm agido assim. E pedem publicamente a intervenção das Forças Armadas no processo político, como se não houvesse na memória histórica do país o significado da última vez que elas fizeram isso.

O marechal golpista e comandante do primeiro governo da ditadura militar, Castello Branco, falava das “cassandras que iam aos bivaques bulir com militares”. É isso que faz o ator Carlos Vereza, que já interpretou no cinema um perseguido e prisioneiro de uma das ditaduras brasileiras, o escritor Graciliano Ramos, e que viu de perto a ação dos golpistas contra Jango.

Vereza criou um blog, o carlosverezablog.blogspot.com. Vejam o primeiro parágrafo de um texto, postado no dia 24/11, quando Dilma já tinha ganhado as eleições: “Cadê as Forças Armadas ? A constituição está sendo continuamente desrespeitada por Lula e seus quadrilheiros; o governo flerta acintosamente com os piores ditadores do planeta; formata-se às claras, um regime comuno-sindicalista, com ameaças nada veladas à liberdade de expressão; mensaleiros são absolvidos por juizes venais; o MST, promove a invasão de propriedades privadas, e o que vemos, estarrecidos, é o absoluto silêncio dos militares, que têm por dever a preservação das instituições democráticas!”

O velho ator clama abertamente por um golpe contra a democracia. A arenga do “regime comuno-sindicalista” é a repetição das “acusações” da direita golpista contra Jango. É triste, mas felizmente vivemos outros tempos e a pregação de Vereza só ressoa em pequenos círculos protofascistas e inconformados com o resultado das urnas.

Outro que dá mostras de ressentimento com a derrota do candidato abertamente apoiado por ele é o apresentador Marcelo Tas, que também flerta com o golpismo, de maneira aparentemente engraçadinha. No twitter, ele pediu que, depois do Rio, o Bope, o Exército e a Polícia “limpassem o Congresso Nacional”. Em 64, também iam fazer isso; tivemos 21 anos de ditadura sanguinária.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 29-11-2010)

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Enfrentar a intolerância

Por João José de Oliveira Negrão

A cena é assustadora. Dois pequenos grupos de jovens caminham em sentido contrário na Avenida Paulista, centro financeiro da maior cidade da América do Sul e uma das maiores do mundo. De repente, do nada, vê-se um dos garotos agredir a outro por duas vezes com uma lâmpada de luz fria. Imediatamente me lembro das recomendações de minha mãe, que alertava para o cuidado com tais lâmpadas, já que, em caso de acidentes com cortes, “a cicatriz ficava muito feia, pois não fechava direito”. Será que ainda é assim?

Ainda naquela noite, o grupo composto por jovens de classe média, sem problemas financeiros e estudantes de escolas privadas – embora já colecionassem expulsões em algumas delas – teria agredido outras três pessoas. O motivo das agressões foi a suposta homossexualidade das vítimas. Na mesma semana, um sargento do Exército brasileiro, no Rio de Janeiro, baleou na barriga um outro jovem, pelo mesmo motivo.

São sinais preocupantes de intolerância, que precisa ser combatida sem tréguas. Em artigos das semanas passada e retrasada, tratei aqui do preconceito contra nordestinos, negros e indígenas que aflorou com o resultado das eleições presidenciais. Embora a onda tenha se originado nas redes sociais, não ficou restrita a elas: artigos publicados na Folha de S. Paulo, pelo jornalista Leandro Narlochi e pela professora de Direito da USP, Janaína Paschoal, botaram mais lenha na fogueira e deram ao preconceito explícito um certo “verniz intelectual”.

Instituições sociais importantes e comprometidas com a democracia, como os sindicatos, universidades, OAB, entre outras, precisam ajudar a enfrentar o ovo da serpente. Sugiro que, para o ano que vem, organizemos debates, palestras e seminários com o objetivo específico de discutir e combater todas as formas de preconceitos. Desde já me coloco à disposição. Se ficarmos quietos, fazendo de conta que é um problema menor, localizado, a intolerância se alastrará. Depois, talvez seja tarde.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 22-11-2010)

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Vítimas, não culpados

Por João José de Oliveira Negrão


O preconceito contra nordestinos, negros e indígenas, “culpabilizados” pela vitória de Dilma Rousseff na eleição presidencial – e que levou a OAB-PE a representar contra a estudante de Direito Mayara Petruso, que teria dado início à onda xenófoba --, continua repercutindo.

 

Na semana que passou, dois novos artigos publicados pela Folha de S. Paulo puseram lenha na fogueira. O primeiro, do jornalista Leandro Narloch – "sim, eu tenho preconceito" – no qual o autor desfila uma série de, digamos, argumentos, em síntese, culpa as vítimas pela pobreza e pela falta de estudos. Ao lê-lo, imediatamente me vi remetido à releitura de Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal. O livro é de Hannah Arendt, de 1963. Tem edição recente e mostra a necessidade de lutar por valores humanistas em tempos sombrios. E que fique claro: NÃO é isto que faz Narloch, ao se vangloriar da obtusidade.


O segundo saiu da lavra da professora de Direito da USP, Janaína Paschoal. Em defesa da estudante Mayara, Janaína utiliza-se de um surrado recurso retórico: começa lembrando que é “neta de pernambucanos”. Na sequência, conforme escreveu a também professora de Sociologia da USP, Heloísa Fernandes, parte para a lógica da inversão: “por ela, não apenas não somos racistas como tudo que acontece é culpa da vítima. Se não fossem os negros, nordestinos, pobres, prostitutas, homossexuais, se Lula não fosse presidente, a estudante não teria cometido o despautério de pedir o assassinato de ninguém e tampouco teria sido demonizada”.

Narloch e Janaína, intelectuais, com formação de primeira linha, demonstram que a educação formal não é garantia absoluta contra o preconceito. O ovo da serpente, tirado do ninho pela campanha de José Serra ao abrir espaços para os fundamentalismos, começa a estalar. Só a retomada da hegemonia de valores democráticos, republicanos e progressistas – o que não significa concordância ou oposição ao governo eleito – poderá livrar o país de um retrocesso que insiste em retornar.

João José de Oliveira Negrão e jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 15/11/2010)

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Preconceito e ódio

Por João José de Oliveira Negrão

O preconceito descarado, xenófobo mesmo, saiu das profundezas e, sem a vergonha com que se manifestava à boca pequena, ganhou o espaço público, em especial pelas redes sociais da internet. Nordestinos, negros, indígenas foram acusados de “culpa” pela eleição da presidenta Dilma Rousseff. E pouco adiantaram as confirmações matemáticas de que mesmo que se só se apurassem votos no Sul e Sudeste, a petista seria eleita com 29,7 milhões de votos contra os 29,4 milhões dados a Serra. O preconceito é uma maneira de se desobrigar a pensar: fornece uma resposta pronta, padrão, antes que o problema seja formulado.

A estudante de Direito Mayara Petruso parece ter dado início à onda xenofóbica. No dia 1º de novembro, postou, no Twitter, que “nordestisto (sic) não é gente, faça um favor a SP, mate um nordestino afogado”. Foi a senha para uma enxurrada de mensagens de mesmo teor. A OAB-PE moveu uma representação contra Mayara, por racismo e incitação à prática de crime. Em São Paulo, surgiu um autodenominado Movimento São Paulo para os Paulistas.

É inegável que tal acirramento é um dos resultados previsíveis dos rumos que tomou a campanha de José Serra. Ao trazer para a frente do palco temas comportamentais, como aborto e fundamentalismo religioso – fora, inclusive, do âmbito decisório de um Presidente da República –, Serra e seu marketing optaram por uma estratégia semelhante à do movimento Tea Party, a ultradireita norte-americana que tem dado dores de cabeça ao presidente Obama. Além disso, no debate na Rede TV!, Serra afirmou que Dilma e o PT não gostam de São Paulo.

A estratégia do ódio, como sabemos, pode até ter conseguido levar a eleição presidencial para o segundo turno, mas não foi suficiente para a vitória de Serra. No entanto, pode ter deixado marcas profundas, fissuras sociais que precisam ser fechadas.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor do Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 08-11-10)

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Conselho não é censura

Por João José de Oliveira Negrão

Passadas as eleições e conhecidos os resultados das urnas, uma discussão, aparentemente específica do campo da Comunicação -- mas que diz respeito ao conjunto da sociedade e ao avanço da democracia participativa –, precisa voltar à cena. Se possível, num nível de maior racionalidade que aquele permitido pelas paixões despertadas pelo processo eleitoral. Estou me referindo à criação dos conselhos estaduais e nacional de Comunicação, resultantes da I Conferência Nacional de Comunicação.

O assunto voltou à pauta com a criação, pela Assembleia Legislativa cearense, do Conselho Estadual de Comunicação daquele estado. Intenção semelhante já manifestaram Alagoas, Piauí e Bahia – o que desmonta argumentos exclusivamente partidários dos adversários dos conselhos: o Ceará é governado pelo PSB, Piauí e Bahia pelo PT e Alagoas pelo PSDB.

É preciso estabelecer, logo de início, que os conselhos não são instrumentos de censura prévia à imprensa, nem querem controlar a circulação de informações e de opiniões. Como demonstraram Bia Barbosa, Jonas Valente, Pedro Caribé e João Brant, membros do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, “os Estados não definem novas regras para a radiodifusão, o que seria prerrogativa da União, mas apoiam a aplicação de princípios constitucionais e leis já existentes, muitas vezes ignorados por concessionárias de rádio e TV. Os conselhos tratam das políticas estaduais, como o desenvolvimento da precária radiodifusão pública e comunitária local, o acesso da população à banda larga, e de critérios democráticos de distribuição das verbas publicitárias governamentais, feitas, em geral, de forma pouco transparente”.

Os grandes meios de comunicação, neste tema específico mais que em outros, não têm aberto espaço ao contraditório. Não só os editoriais, mas também as reportagens “informativas” têm, via de regra, só ouvido fontes contrárias à criação dos conselhos. É sintomático.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 01/11/10)

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

21 anos domingo

Por João José de Oliveira Negrão

Domingo a democracia brasileira faz aniversário. Completaremos 21 anos de processo democrático ininterrupto, fato raro na nossa história. Em 1989, depois de uma longa transição – que envolveu, como ponto final, o mandato de José Sarney, vice-presidente escolhido ao lado de Tancredo Neves por um Colégio Eleitoral – efetivamente chegava ao fim o ciclo da ditadura militar, instalado com o Golpe de 1964.

As eleições de 89 foram disputadas por 22 candidatos a Presidência. Presentes as velhas forças de apoio à ditadura, como Aureliano Chaves (PFL) e Paulo Maluf (PDS); a oposição tradicional, como Ulysses Guimarães (PMDB), Leonel Brizola (PDT) e Roberto Freire (PCB); uma nova direita, com Fernando Collor (PRN), Ronaldo Caiado (PSD) e Guilherme Afifi Domingos (PL). Apareciam também as candidaturas de Lula (PT), Mário Covas (PSDB) e Fernando Gabeira (PV). E também os partidos nanicos, com figuras folclóricas como Enéas Carneiro (PRONA), Marronzinho (PSP) e Armando Correa (PMB)

Para o segundo turno, foram Lula e Collor. De um lado (Lula) ficaram todos aqueles que tinham enfrentado a ditadura: Brizola, Covas, Ulysses, Freire, Gabeira. De outro (Collor), as forças de apoio aos militares e a nova direita: Maluf, Aureliano, Caiado, Afif.

Já nas eleições seguintes, começava uma disputa entre dois partidos novos, filhos da redemocratização. PT e PSDB polarizaram as eleições de 94 e 98 – vencidas pelos tucanos, com FHC –, 2002 e 2006 – vencidas pelos petistas, com Lula. O segundo turno das eleições de 2010 mantém a disputa: PT e PSDB novamente se enfrentam. E não é coincidência, pois são os únicos partidos que têm um projeto político e de Nação para o Brasil.

São também os únicos efetivamente organizados em todo o país e que, apesar de suas figuras de proa, são capazes de existir sem depender de uma liderança carismática. Apesar de pontos de contato em sua história, eles representam projetos distintos. Cabe ao eleitor escolher qual deles quer para o Brasil.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp
(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 25/10/10, com o título alterado pela redação para "Democracia conquistada"

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Liberdade para os iguais

Por João José de Oliveira Negrão

“Agora que os mais pobres conseguiram levantar a cabeça acima da linha da mendicância e da dependência das relações de favor que sempre caracterizaram as políticas locais pelo interior do País, dizem que votar em causa própria não vale. Quando, pela primeira vez, os sem-cidadania conquistaram direitos mínimos que desejam preservar pela via democrática, parte dos cidadãos que se consideram classe A vem a público desqualificar a seriedade de seus votos”.

Assim terminava o artigo, favorável ao governo, que custou a demissão da psicanalista Maria Rita Kehl do conjunto de articulistas do jornal O Estado de S. Paulo. O tradicional e conservador diário paulistano, de maneira transparente, apoia a candidatura Serra. O avanço da posição explícita, no entanto, sucumbiu frente ao ataque à pluralidade. Assim, a liberdade de expressão é só para quem pensa igual Na mesma seara, a Folha de S. Paulo, apelando para a Justiça, conseguiu tirar do ar um blog satírico chamado Falha de S. Paulo, alegando “uso indevido da marca”.

São estes mesmos jornais, linhas de frente de instituições conservadoras com a ANJ (Associação Nacional de Jornais), a SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa) e o Instituto Millenium, que seguidamente alertam para supostos “ataques” à liberdade de imprensa e de expressão promovidos pelos governos de centro-esquerda latinoamericanos.

No entanto, até o momento em que este artigo é finalizado (domingo pela manhã), nenhuma destas organizações se manifestou sobre a demissão de Maria Rita ou sobre a proibição ao blog. Também não o fizeram os convertidos neoconservadores Marcelo Tas nem o comediante Marcelo Madureira. E não se sabe se os humoristas da Globo estão organizando alguma manifestação para as ruas do Leblon, em nome da liberdade.

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 11/10/10)

Aposta no retrocesso

Por João José de Oliveira Negrão

No final de setembro de 2008, aqui neste espaço, escrevi, a respeito do PSDB, que “aquele sopro modernizador do início logo transmudou-se, ao chegar ao poder com FHC, na repetição dos processos de modernização conservadora tão comuns à nossa história. As veleidades social-democratas, a ideia do Estado de Bem Estar Social e as tinturas keynesianas de política econômica foram abandonadas, trocadas pela realpolitik neoliberal então em voga. Em verdade, os princípios social-democratas estão hoje em outras mãos e os tucanos são, tão somente, conservadores tradicionais. Assim, o PSDB envelheceu antes de amadurecer. Para quem tinha, segundo Sérgio Motta, um projeto de 20 anos de poder, a senilidade chegou antes”.
 Os rumos que Serra tomou aceleraram ainda mais este processo. De conservadores tradicionais, os tucanos foram para a direita mais anacrônica. O fundamentalismo religioso, o moralismo e o neoudenismo – em tudo lembrando a oposição que o Tea Party faz a Obama – colonizaram de vez a campanha tucana. Serra, Aloysio Nunes, José Anibal, Alberto Goldman, entre outros, com origem política em grupos de enfrentamento à ditadura, como a Ação Popular (AP), ALN, de Marighela, e o velho Partidão (PCB), hoje parecem os graves senhores da Marcha com Deus pela Família, predecessora do golpe de 64. A própria TFP distribui panfletos em encontro nacional do PSDB, enquanto uma de suas principais lideranças, o governador eleito Geraldo Alckmin, flerta com o Opus Dei, outro grupo da ultradireita católica.

O projeto político tucano se deslocou para a polícia comportamental, é regressivo e os compromissos assumidos com os grupos fundamentalistas – que não agem na política movidos tão somente por interesses ideológicos, mas buscam, por exemplo, concessões de TV – podem cobrar um alto preço daqueles que, há cerca de duas décadas, nasceram dos ventos modernizantes que sopraram no Brasil pós ditadura. É pena.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Mudança real

Por João José de Oliveira Negrão

O Brasil vem, efetivamente, mudando no rumo de um país mais desenvolvido e com menor desigualdade social. Prova disso não vem de nenhum instituto ligado ao governo federal, mas do Centro de Políticas Sociais, da Fundação Getúlio Vargas, coordenado pelo economista Marcelo Neri. O livro A Nova Classe Média: o lado brilhante dos pobres, bem como uma série de slides com gráficos e tabelas da pesquisa estão disponíveis a todos os interessados em www.fgv.br/cps/classe_media/.

Os dados mostram uma série de indicadores que permitem afirmar tal melhora. A renda média do brasileiro – atualizada para valores de 2009 --, saiu de R$ 385,5 em 1992 e chegou a R$ 630,25 em 2009. Outra número importante é o Índice de Gini, usado internacionalmente como indicador de igualdade social. Quanto mais perto de zero, mais igualitário é o país na distribuição da renda. Pois bem, o Brasil estava em 0,6091 em 1990 e foi para 0,5448 em 2009.

Importante também é a evolução da distribuição de classes de renda. As classes D/E, os mais pobres, cuja renda domiciliar é de até R$ 1126,00, eram 62,1% da população brasileira em 1992. Em 2009, elas cairam para 38,94%. Já a classe C, de renda domiciliar acima dos R$ 1126,00 até R$ 4854,00, que era 32,5% dos brasileiros em 92, em 2009 chegou a 50,5% da população. A classe média, portanto, já é a maioria da nossa população.

São dados reais, como estes, que explicam a popularidade do governo Lula e os índices de intenção de voto da candidata da situação, Dilma Rousseff. O voto tem alto grau de racionalidade, e quem continuar apostando que eleição é apenas um ato emocional vai continuar quebrando a cara.

João José de Oliveira Negrão e jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 13/09/2010)

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Que oposição?

Por João José de Oliveira Negrão

O crescimento exponencial da intenção de votos em Dilma Rousseff, candidata presidencial do PT e do presidente Lula, ao lado da queda significativa de José Serra (pelo Ibope divulgado sábado Dilma tem 51% contra 27% de Serra e 7% de Marina), já leva analistas e operadores da política a imaginar cenários pós-eleitorais.

A oposição atual, liderada pelo PSDB, sairá muito enfraquecida, mais ainda se firmar-se a possibilidade tendencial da subida de Aloizio Mercadante no estado de SP, principal cidadela tucana. Além de SP, outros estados, hoje em poder dos tucanos, podem mudar de mãos, como o Rio Grande do Sul, onde a governadora tucana Yeda Crusius, candidata à reeleição, patina num terceiro lugar, atrás do petista Tarso Genro e do peemedebista José Fogaça. Em Minas, o candidato do governador Aécio Neves, Antônio Anastasia, vem recuperando terreno, mas ainda está atrás do ministro Hélio Costa, do PMDB. No RJ, sem luz própria, o PSDB embarcou na candidatura do verde Fernando Gabeira, também mal colocado. Na Bahia e em Pernambuco também não há tucanos viáveis. E o Democratas, irmão siamês do PSDB, não está em situação melhor.

Os petistas podem, eventualmente, se alegrar, mas o cenário preocupa. Em um mais que provável governo Dilma, a atual oposição em frangalhos poderá abrir espaços para uma direita reacionária do tipo Tea Party norte-americano, que tem colocado os republicanos em incontáveis saias justas na oposição a Obama. Uma direita furiosa, atrasada, antidemocrática e com poucas perspectivas eleitorais, mas capaz de fazer barulho e alimentar o ovo da serpente. É preciso ficar atento.

João José de Oliveira Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 30/08/2010) 

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Jornalistas reafirmam defesa do diploma e decisão de não sindicalizar não diplomados

Por www.fenaj.org.br

A defesa do Jornalismo como essencial à democracia e dos jornalistas como categoria fundamental para garantir o direito da sociedade à informação marcou o 34º Congresso Nacional dos Jornalistas, realizado de 18 a 22 de agosto em Porto Alegre. Destacaram-se entre as resoluções as lutas pela aprovação das PECs dos Jornalistas, pela democratização da comunicação, criação do Conselho Federal dos Jornalistas e por uma nova e democrática Lei de Imprensa, além da manutenção da decisão de não sindicalizar não diplomados. A nova diretoria da FENAJ, presidida por Celso Schröder, tomou posse no evento.

Nos três dias de debates, painéis e miniconferências abordaram temas como o Jornalismo como necessidade social e a conjuntura nacional, a política e os conflitos sociais na América Latina, a desregulamentação das profissões no Brasil, a defesa da profissão de Jornalista e o ensino do Jornalismo, novas tecnologias e direitos autorais. Houve, também, oficinas sobre gênero, raça e etnia e encontros para tratar da organização internacional da categoria, particularmente na perspectiva dos jornalistas latinoamericanos e dos países que falam a língua portuguesa.

Já em três plenárias deliberativas foram aprovadas dezenas de propostas que compõem o Plano de Lutas da Federação Nacional dos Jornalistas para o próximo período. Dentre elas destaca-se a luta pela restituição do diploma de curso superior de Jornalismo como requisito para o exercício da profissão, com mais mobilizações pela aprovação das Propostas de Emenda Constitucional que tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado com este objetivo. Este será, também, o centro de um Termo de Compromisso que as entidades sindicais dos jornalistas encaminharão aos candidatos à Presidência da República e aos governos estaduais com as principais reivindicações da categoria.

Também compõem eixos centrais do plano de ação da FENAJ para o próximo triênio as lutas pela democratização da comunicação com a implementação das resoluções da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), pela aprovação de uma nova e democrática Lei de Imprensa, pela criação do Conselho de Comunicação Social e do Conselho Federal de Jornalistas (CFJ) e pela definição de um piso salarial e contrato coletivo nacional para os jornalistas.

O 34º Congresso Nacional dos Jornalistas aprovou, também, a manutenção da decisão de não sindicalizar e não emitir carteiras para não diplomados. Uma comissão formada por representantes dos sindicatos da categoria e da FENAJ sistematizará, até março de 2011, propostas de enfrentamento dos problemas surgidos após a fatídica decisão do STF de extinguir com a exigência do diploma para o exercício da profissão, particularmente quanto ao registro profissional.

No sábado (21/08), ao final dos trabalhos, houve solenidade de entrega da Comenda de Honra da FENAJ aos jornalistas Nilson Lage e Daniel Herz (in memorian) e a posse das diretorias recém eleitas do Sindicato dos Jornalistas do Rio Grande do Sul e da FENAJ, presididas respectivamente por José Nunes e Celso Schröder. Os trabalhos do Congresso de Porto Alegre foram encerrados no domingo com reunião da nova direção da FENAJ.

As principais resoluções do 34º Congresso Nacional dos Jornalistas estão sintetizadas na “Carta de Porto Alegre”, cuja íntegra segue abaixo. O conjunto das resoluções do Congresso está sendo sistematizado e será disponibilizado no site da FENAJ nos próximos dias. Deliberou-se, ainda, que o 35º Congresso Nacional da categoria, a realizar-se em 2012, será em Rio Branco, no Acre.

Carta de Porto Alegre
Os jornalistas brasileiros, reunidos em seu 34º Congresso Nacional, realizado em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, de 18 a 22 de agosto de 2010, dirigem-se à Nação Brasileira para reafirmar a defesa do Jornalismo como bem público essencial à democracia e a defesa dos jornalistas como categoria profissional responsável pela efetiva produção jornalística, dentro do princípio do direito da sociedade à informação.

Há no país uma ação permanente patrocinada pelos grandes grupos de comunicação para desqualificar o Jornalismo, confundindo propositadamente a produção de informação jornalística com entretenimento, ficção e mera opinião. Igualmente, a categoria dos jornalistas sofre ataques à sua constituição e organização.

Por isso, mais uma vez, os jornalistas brasileiros afirmam a defesa da regulamentação da profissão e conclamam a sociedade a apoiar a luta pela aprovação das Propostas de Emendas Constitucionais (PECs), em tramitação no Congresso Nacional, que restituem a exigência da formação de nível superior específica para o exercício da profissão.

Os jornalistas brasileiros entendem que a luta pela regulamentação da profissão e pela democratização da comunicação é de interesse público. Por isso, pedem a continuidade da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) como instância democrática e plural de discussão e deliberação das políticas públicas para o setor.

Em seu 34º Congresso Nacional, os jornalistas brasileiros afirmam a necessidade de dar consequência às decisões da 1ª Confecom e destacam como prioridade a criação do Conselho Nacional de Comunicação como instância deliberativa, a criação do Conselho Federal de Jornalistas (CFJ) e do Código de Ética do Jornalismo e a aprovação de uma nova e democrática Lei de Imprensa para o país.

Não por acaso, no mesmo período de realização do 34º Congresso dos Jornalistas, a Associação Nacional dos Jornais (ANJ) reuniu-se no Rio de Janeiro para defender seus interesses empresariais, antagônicos aos da grande maioria do povo brasileiro. Falsamente, a ANJ afirma defender a liberdade de expressão e de imprensa, mas aponta para uma autorregulamentação do setor, sob o controle do patronato, em contraposição às propostas de regulação e regulamentação, por lei, defendidas pelos trabalhadores.

Os jornalistas brasileiros denunciam a exploração a que são submetidos pelos donos dos veículos de comunicação, que violam abertamente os mais comuns direitos trabalhistas. Reafirmam sua luta por melhores condições de salário e trabalho, pelo respeito à jornada diária, pela aplicação do Código de Ética da profissão, pela garantia de segurança no exercício profissional e contra a precarização das relações de trabalho. Tomam, ainda, a iniciativa de fortalecer a posição dos jornalistas no âmbito da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e de outras centrais sindicais.

Além das lutas sindicais específicas, os jornalistas brasileiros se comprometem a trabalhar no combate ao racismo e pela promoção de políticas de equidade de gênero, raça e etnia na organização da categoria e na produção jornalística. Também destacam a importância de fortalecer os veículos públicos de comunicação e seus serviços noticiosos, como a Voz do Brasil, ameaçada atualmente por um projeto de lei apoiado pelas empresas jornalísticas.

As lutas da categoria no Brasil somam-se às dos jornalistas de outros países da América Latina e do Caribe, do continente africano e dos demais países reunidos na Federação Internacional dos Jornalistas (FIJ), que estiveram presentes no 34º Congresso Nacional.

Por fim, às vésperas de eleições gerais no país, os jornalistas brasileiros conclamam os candidatos, em nível nacional e estadual, a se comprometerem com as bandeiras da democratização dos meios de comunicação e com a defesa do Jornalismo e da regulamentação profissional dos jornalistas.

Porto Alegre, 21 de agosto de 2010

Resposta a Paulo Ghiraldelli: A democracia funciona sem deus

Por Daniel Lopes, do blog Bacaroço www.bacaroco.org


Por muito tempo admirei o trabalho do Professor Paulo Ghiraldelli. Estudante de Filosofia que sou, por opção, por prazer, por apreciar o conhecimento; decidi que seria meu próximo curso, depois de Direito. Assim, realizaria meu sonho de ser Professor.

Firme em meus posicionamentos, desde o tempo de minha primeira fase no movimento estudantil, jamais abandonei minhas convicções de esquerda, respeitando à democracia. Respeitando, sobretudo, àqueles que discordavam de minhas posições.

Pois bem, ao questioná-lo, no twitter, o Professor Paulo Ghiraldelli, filósofo, mestre e doutor, frente às suas “denúncias” contra o jornalista Luis Nassif, dizendo ter sido “comprado” pelo PT, chamando-o de “ladrão”, pedi que apresentasse provas, bem como, dissesse em quem seria seu voto para Presidente, e obtive como respostas:

1) ghiraldelli @daniellopes13 vocês petistas são bandidos mesmo! O cara foi denunciado e provado, tem Cia fantasma. Deixe de ser filho da puta!
2) ghiraldelli @daniellopes13 é necessário mais provas contra Nassif, você não lê jornal não? Ah, esqueci que muitos petistas jovens são analfabetos.
3) ghiraldelli @daniellopes13 cala boa idiota, você é um petista e faz parte do grupo de bandidos ou de burros
4) ghiraldelli@daniellopes13 vá moleque burro, só de ser petista já mostra que é um tonto, cai fora

Após demonstrar preconceito de classe em suas afirmações ofensivas contra minha pessoa, para minha surpresa, Luis Nassif acompanhava a discussão e me respondeu:
luisnassif @daniellopes13 Ele vai poder provar em juizo. Já gravei os comentários.”

Depois disso, o Professor parou de me ofender, sem responder qual seria seu voto para Presidente da República.

Hoje, em seu site, publica texto “A democracia funciona sem deus” e, de maneira mais respeitosa, como que um resvalo de retratação, denuncia que Nassif recebe “55 mil reais por mês do governo federal, do PT”. E que isso ocorreu sem licitação, embora legal, referindo-se como não sendo uma “justificativa honesta”.
A expressão “ladrão” virou “imoral”, “moleque burro; petistas analfabetos e filho da puta” virou “caras de pau” e a pergunta relativa a sua opção de voto: “elas (as pessoas) não estão interessadas na prática honesta… querem saber em quem eu voto para, então, procurar defeito no que seria o meu candidato (…)”.

Quando questionei o Professor Ghiraldelli sobre qual seria a tipificação do crime, tendo em vista ser esse tipo de contratação legal, fui chamado de “analfabeto, filho da puta e burro”.

A democracia liberal prevê tais abordagens, Professor?

Qual a relação entre saber seu voto e não ter interesse em práticas honestas?

O senhor chamou Luis Nassif de “ladrão”, os petistas de analfabetos… É assim que se constrói a democracia liberal em nosso país?

A democracia é feita sem deus. Assim como não podemos nos sentir deus.

Deus me livre desse deus!

PS:
Texto: “A democracia funciona sem deus”

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Moção do atraso

Por João José de Oliveira Negrão

Pode ser votada amanhã, pela Câmara de Sorocaba, uma moção de repúdio à chamada Lei da Palmada. Promulgada pelo Governo Federal, ela proíbe explicitamente castigos físicos às crianças. O autor da moção é o vereador Ditão Oleriano, atualmente no PMN, mas que já navegou por uma série de partidos. Ele entende que os pais precisam da violência para impor limites aos filhos e até acha que o uso da vara de marmelo deve ser tolerado. Este senhor é o mesmo parlamentar que, da tribuna da casa de leis, defendeu a ditadura militar que torturou, matou e infelicitou o país por mais de 20 anos. Quer dizer, ele representa a vanguarda do atraso.

Ditão verbaliza um sentimento subreptício, que perpassa segmentos da nossa sociedade: a ideia de que todos os conflitos se resolvem por meio da violência do mais forte sobre o mais fraco. Clamam pela pena de morte, acham que prisão é instrumento de vingança, não de recuperação – e gostariam de trazer de volta as masmorras medievais. Despreparados para o diálogo, intolerantes com as diferenças, tais setores, no fundo, adorariam um ditador que a tudo uniformizasse.

Tomara que, divergências políticas à parte, os demais vereadores não permitam que Sorocaba passe por mais este vexame. Já bastam a troca de dez secretários municipais em um ano – um deles acusado de pedofilia – e a postura homofóbica da bancada evangélica.

A Lei da Palmada é um instituto que torna mais contemporânea nossa legislação. Chega de achar que dentro de casa o homem pode bater na mulher, pais podem espancar os filhos e ninguém pode meter a colher. O Brasil está mudando, com mais distribuição de renda, mais cultura e mais democracia. Os adoradores do passado devem ficar para trás.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Lembranças do JN

Por Laurindo Lalo Leal Filho

O destaque dado pela mídia ao Jornal Nacional na última semana, em razão das entrevistas realizadas com os candidatos à presidência da República, trouxe a minha memória o episódio de cinco atrás quando acompanhei com colegas da USP uma reunião de pauta daquele programa.

Contei em artigo publicado na revista Carta Capital e depois reproduzido no livro “A TV sob controle” o que vi e ouvi naquela manhã no Jardim Botânico, no Rio. Mostrei como se decide o que o povo brasileiro vai ver à noite, no intervalo entre duas novelas. Ficou clara, para tanto, a existência de três filtros: o primeiro exercido pelo próprio editor-chefe a partir de suas idiossincrasias e visões de mundo cujos limites se situam entre a Barra da Tijuca e Miami, por via aérea.

O segundo e o terceiro filtros ficam mais acima e são controlados pelos diretores de jornalismo e pelos donos da empresa, nessa ordem. Não que o editor-chefe não tenha incorporado as determinações superiores mas há casos que vão além de sua percepção e necessitam análise político-econômica mais refinada.

As entrevistas com os presidenciáveis passaram, com certeza, pelos três filtros e os resultados o público viu no ar. O candidato do PSOL tendo que refazer uma fala cortada pela emissora e a candidata do PT deixando de ser entrevistada para ser inquirida. Para os outros dois candidatos da oposição a pegada foi mais leve, de acordo com a linha editorial da empresa.

Nada diferente do que vi em 2005 quando uma notícia oferecida pela sucursal de Nova York foi sumariamente descartada pelo editor-chefe do telejornal. Ela dava conta de uma oferta de óleo para calefação feita pelo presidente da Venezuela à população pobre do estado de Massachussets, nos Estados Unidos, a preços 40% mais baixos do que os praticados naquele pais. Uma notícia de impacto social e político sonegada do público brasileiro.

Ou da empolgação do editor-chefe em colocar no ar a notícia de que um juiz em Contagem (MG) estava determinando a soltura de presos por falta de condições carcerárias. Chegou a dizer, na reunião de pauta, que o juiz era um louco e depois abriu o jornal com essa notícia sem tentar ouvir as razões do magistrado e, muito menos, tocar na situação dos presídios no Brasil. O objetivo era disseminar o medo e conquistar preciosos pontos de audiência.

Diante dessas lembranças revirei meu baú com mensagens recebidas na época. Foram dezenas apoiando e cumprimentando pelas revelações feitas no artigo.

Reproduzo trechos de uma delas enviada por jornalista da própria Globo:

“Discordo da revista Carta Capital num ponto: o texto ‘De Bonner para Homer’ não é uma crônica. É uma reportagem, um relato muito preciso do que ocorre diariamente na redação do telejornal de maior audiência do País.

As suas conclusões são, porém, mais esclarecedoras do que uma observação-participante. Que fique claro: trabalho há muito tempo na Globo, não sou, portanto, isento.

Poderia apresentar duas hipóteses relacionadas à economia interna da empresa para a escolha do editor-chefe do JN:

1) a crise provocada pelo endividamento levou a direção da rede a tomar medidas para cortar de despesas. Em vez de dois altos salários - o de apresentador e o de editor-chefe - para profissionais diferentes, entregou a
chefia ao Bonner. Economizou um salário.

2) como é profissionalmente fraco, não tem experiência de campo, nunca se destacou por nenhuma reportagem, o citado apresentador tem o perfil adequado para o papel de boneco de ventríloquo da direção do Jornalismo.

A resposta para a nossa questão deve estar bem próxima dessas duas hipóteses. De todo modo, os efeitos são devastadores: equipe dividida, enfraquecida e só os mais inexperientes conseguem conviver com o chefe tirano e exibicionista.

‘Infelizmente, é um retrato fiel’, exclamou uma repórter experimentada diante do seu texto.

Eu me sinto constrangido e, creia-me, não sou o único por aqui”.


É a esse tipo de organização que os candidatos à presidência da República devem se submeter se quiserem falar com maior número possível de eleitores. Constrangimento imposto pela concentração absurda dos meios de comunicação existente no Brasil, interferindo de forma perversa no jogo democrático.

Laurindo Lalo Leal Filho, sociólogo e jornalista, é professor de Jornalismo da ECA-USP. É autor, entre outros, de “A TV sob controle – A resposta da sociedade ao poder da televisão” (Summus Editorial).

(Publicado originalmente em www.cartamaior.com.br)

Apartheid paulistano

Por João José de Oliveira Negrão

Diferentes jornais trataram, na semana que passou, de um assunto que mostra o quanto certos segmentos da elite brasileira vivem alheios à realidade, num processo que talvez a psicologia social seja capaz de explicar: alguns moradores de Higienópolis mostraram-se contrários à instalação de estação de metrô no bairro, para não terem de se “misturar a essa gente”. É apartheid social, mesclado a étnico, em estado puro.

Esta mesma franja social é, ao mesmo tempo, origem e destino do discurso do medo, já verbalizado em 2004 pela atriz Regina Duarte e em 2010 pela jornalista (?) Danuza Leão, contra os avanços sociais do atual governo e contra a possibilidade de setores da esquerda brasileira chegarem ao poder de estado. Na falta de um dos seus, mais “puro”, esse segmento da sociedade opta por Serra, embora este, na juventude, tenha cometido deslizes “esquerdistas” e não venha de berço nobre.

No outro polo, dados de pesquisa do publicitário Renato Meirelles, do Data Popular – citados pelo blog Vi o Mundo, do jornalista Luiz Carlos Azenha – mostram que dos jovens de 25 anos da classe A, só 10% estudaram mais que os pais; dos jovens de 25 anos da classe C, 68% estudaram mais que os pais. “É a primeira geração de universitários em massa em nossa História contemporânea”, diz Azenha. E nos próximos 12 meses, 8,7 milhões de brasileiros das classes C e D vão viajar pela primeira vez de avião.

O que explica a reação de “moradores” de Higienópolis é exclusivamente o preconceito, uma vez que não há segmento da economia brasileira que não tenha crescido do governo “dessa gente” – ou “dessa raça”, como se referiu, certa vez, o ex-senador e ex-presidente do PFL (atual DEM), Jorge Konder Bornhausen. Mas a ascensão social de milhões de brasileiros, por outro lado, explica o crescimento da candidatura Dilma Rousseff, que pode levar a eleição presidencial no primeiro turno.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Sociologia Política e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 16/08/2010)

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Debates sem graça

Por João José de Oliveira Negrão

Os debates entre candidatos a presidente e a governadores perderam emoção e graça. As tiradas cômicas e inteligentes têm espaço e os enfrentamentos são mornos, mimetizando as estratégias dos marqueteiros que dirigem as campanhas eleitorais. De maneira geral, foram estas as críticas que apareceram após o primeiro debate entre os presidenciáveis, realizado pela TV Bandeirantes na última quinta-feira.

Há um aspecto decisivo para esta análise, no entanto, que só vi tratado na coluna de Clóvis Rossi na Folha de S. Paulo de ontem: a normalidade democrática tende a tornar rotineira a disputa. E se isso reduz a emoção dos grandes enfrentamentos do passado recente – no youtube encontramos passagens históricas de debates entre Lula, Collor, Jânio, Montoro, Maluf, Brizola, etc. –, por outro lado significa que a democracia está cada vez mais consolidada entre nós e que as eleições fazem parte da rotina da vida da sociedade.

Assim, os conflitos entre os diferentes projetos políticos, entre esquerda e direita – distinção que, entendo, mantém toda sua capacidade explicativa – se dão em outros marcos. Além disso, a estrutura do veículo onde acontecem os debates, a televisão, não permite excessos de intervenção: se todos falarem ao mesmo tempo – como acontece entre dez de dez 'mesas redondas' esportivas –, ninguém entende nada e a tendência de fuga do telespectador é grande.

Isso, de certa maneira, torna comparativamente menor, em relação ao passado recente, a importância dos debates na TV, embora ela continue elevada. Além deles e do horário eleitoral, os eleitores utilizam-se de outros mecanismos para suas escolhas. Talvez se possa dizer que o mais importante, ainda, é a ação política dos sujeitos coletivos.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 09/08/10)

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Serra e Índio: qual o apito?


E finalmente descortinou-se – sob os estarrecidos olhares dos eternos ingênuos – a verdade que todos, há muito tempo, já conheciam. A fluidez do processo político brasileiro, suas clivagens e crises que podem decorrer da percepção de resultados eleitorais adversos, levaram o candidato José Serra a revelar sua verdadeira natureza de classe. Reativando um surrado discurso udenista, o ex-presidente da UNE passou a endossar o protofascismo de sua base de sustentação. Mais que assegurar a adesão de eleitores da direita, pôs por terra uma tese que ganhava espaço na grande mídia e em conhecidos círculos acadêmicos.

A caracterização simplória do cenário político definia as próximas eleições mais como uma disputa por espaço eleitoral do que como polarização ideológica de projeto de país. Ressurgia, com endosso de algumas lideranças esquerdistas, a visão dos dois partidos hegemônicos (PT e PSDB) como agrupamentos politicamente inautênticos, sem verdadeiras raízes na estrutura social e sem diferenciação ideológicas nítida. A distinção se daria apenas na maior ou menor capacidade de conseguir recursos, ganhos incrementais que ignoram modificações substantivas nos programas públicos. Nada mais falacioso. Nada mais revelador da fragilidade analítica dos que vêem no governo Lula uma continuidade pura e simples da gestão FHC. As sobejas dificuldades do candidato da direita, sua necessidade de marcar posição, desmentiram os estudos de encomenda.

Ao afirmar que “o PT é chavista, que mantém relação com as Farc, e prima por desrespeitar direitos humanos”, Serra incorporou a visão de mundo da nova direita. Um estrato que, ameaçado pela abrangente emergência social promovida nos últimos oito anos, destila raiva e ressentimento; típicos da intolerância retórica que o distingue. Impossibilitada de construir sua identidade pela inserção no processo produtivo, essa parcela da classe média forja a auto-imagem por diferenciação das classes fundamentais. Sabe que não é o que mira, mas não sobrevive sem o sentimento subjetivo de pertencer a uma elite idealizada. É nesse aspecto da nossa estrutura social que Índio e Serra passam a querer o mesmo apito. E a falar o mesmo dialeto.

As diatribes recentes do candidato tucano têm uma imensa serventia para os setores progressistas. Ao criticar as relações do governo petista com países sul-americanos e com a China, assegurando que “estamos fazendo filantropia com Paraguai e Uruguai e concessões excessivas ao país asiático”, Serra sinaliza que, no caso de uma eventual vitória em outubro, retomaria a política externa de subalternidade aos interesses estadunidenses. A volta da "diplomacia de pé de meia” não é uma questão menor nem uma mudança de rota desprezível.

A própria capacidade de o país de decidir soberanamente sobre seus destinos estará novamente em jogo. A orientação tendente a beneficiar o diálogo com os países vizinhos, superando assimetrias e promovendo uma autêntica integração, para ter continuidade e ser aprofundada, não pode conviver com a submissão vergonhosa ao imperialismo. O que está em jogo, neste momento, é a verdadeira segurança nacional.

Os inimigos dos reais interesses do país, ao contrário do que pretende a oposição e seu braço midiático, não são os governos de Evo Morales e de Hugo Chávez, a quem Serra, repetindo Uribe, acusa de "abrigar as Farc". O que ameaça a nação brasileira é a humilhante prostração aos ditames de Washington. Em um país com instituições minimamente democráticas, Serra e seu vice têm como lugar certo a lata de lixo da história.

Quanto mais nos aproximamos de outubro, aumenta a urgência de ampla mobilização dos trabalhadores e demais setores populares em defesa das suas conquistas sociais e econômicas, alcançadas nos dois mandatos do presidente Lula. É bom lembrar que não se deve esperar da nova direita, que sustenta Serra, uma análise serena de um governo popular. Para ela é imperdoável que tenha havido um período tão rico em cidadania, tão pródigo em participação nos debates sobre problemas nacionais.

Jonathan Swift escreveu, certa vez, que se pode identificar um gênio pelo número de imbecis que lhe atravancam o caminho. Se o criador de Gulliver tiver razão, Lula e sua candidata, a ex-ministra Dilma Roussef, têm excelentes títulos para exigir que lhes reconheçam a genialidade. Com inveja, com rancor, com incompreensão, mobiliza-se contra eles o que há de pior na sociedade brasileira. E ainda há quem não veja diferença entre os atores.

Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil

(Publicado originalmente em www.cartamaior.com.br)

Educação política

Por João José de Oliveira Negrão

Tenho defendido, neste espaço, a tese do incremento do nível de racionalidade no voto conforme nossa população vai ampliando sua experiência democrática. A educação política não se resume à educação formal, embora não a despreze. Com isso, quero dizer que mais anos de estudo não implicam automaticamente em maior discernimento na hora da escolha do candidato, ao contrário do que deixaram transparecer certos artigos conservadores ao analisar dados de levantamento do TSE a respeito da escolaridade dos eleitores.

A educação política vem pela prática da participação cidadã, mas é tarefa, também – além das escolas de todos os níveis – de outras instituições sociais que se comprometam com a democracia. Entre elas, papel de destaque merece a imprensa, tanto a impressa quanto a eletrônica.

Ela, no entanto, tem deixado a desejar. Nosso jornalismo político, com poucas exceções, tem se focado mais na baixa fofoca política, no disse-me-disse, nas provocações baratas, e menos nas questões de fundo, na informação e na análise de peso. E até boas ideias, como a deste Bom Dia, de levantar temas para serem respondidas pelos candidatos da região, não se resolvem bem: o espaço para as respostas (115 caracteres) é exageradamente curto.

Além disso, as perguntas são excessivamente genéricas e não distinguem com clareza o que pertence ao universo decisório de um presidente da República, de um governador, de um senador, de um deputado federal e de um estadual. Essa generalidade, ao contrário das aparências, não contribui para o aprofundamento da educação política da população.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Sociologia Política e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 02/08/2010)

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Juiz do Maranhão cala blogueiro, em dois minutos

Por Leandro Fortes

O juiz Alexandre Lopes de Abreu, diretor do Fórum Sarney Costa em São Luís e respondendo pela 6ª Vara Cível, decidiu censurar o blog do jornalista Itevaldo Júnior, atendendo um pedido de liminar do juiz Nemias Nunes Carvalho, da 2ª Vara Cível da capital. A decisão de Alexandre Abreu determina que o jornalista retire imediatamente do blog www.itevaldo.com uma reportagem onde ele revela que o juiz Nemias Carvalho comprou uma fazenda de 101,19 hectares, de um acusado que o próprio magistrado revogara a prisão. A ré estava foragida quando da revogação da prisão, mas, em seguida, negociou a propriedade por R$ 5.ooo,00 às margens da BR-316. A decisão liminar foi proferida na última sexta-feira, dia 16. O juiz Alexandre Abreu decidiu em dois minutos, o deferimento, como comprova a movimentação processual disponível no site do Tribunal de Justiça do Maranhão:

Às 14:00:48 – CONCLUSOS PARA DESPACHO / DECISÃO. sem informação.
Às 14:02:39 – CONCEDIDA A MEDIDA LIMINAR
”.

Na decisão, o juiz da 6ª Vara Cível ordena que o jornalista retire imediatamente do blog a matéria “JUIZ NEMIAS CARVALHO: NOUTRA POLÊMICA”, publicada no último dia 12. O juiz determinou ainda que o blog “se abstenha de proceder a qualquer alusão ou referência ao nome do autor, até decisão final da causa”. Além de estipular uma multa diária de R$ 500,00, caso seja descumprida a decisão liminar. O jornalista cumpriu a determinação judicial, hoje, logo após ser notificado às 7h05 da manhã em sua residência. Ainda em sua decisão, o juiz afirma que “a dignidade da pessoa” é um “bem maior” que a “liberdade de manifestação”. Itevaldo Júnior afirmou que recorrerá da rápida decisão. “A celeridade dessa decisão é de fazer inveja ao velocista jamaicano Usaih Bolt”, ironizou o jornalista.

(http://brasiliaeuvi.wordpress.com)

Importância do vice

Por João José de Oliveira Negrão

A nossa recente (pouco mais de 20 anos) retomada democrática já deu exemplos de sobra a respeito da importância dos candidatos a vice. Tivemos a assunção de Itamar Franco com o impeachment de Collor, a subida ao governo do estado de Alckmin com a morte de Covas e a de Kassab com a saída de Serra da prefeitura de São Paulo para disputar o governo do estado. Outros estados e cidades do país viveram experiências semelhantes.

Por isso, é importante que os eleitores dediquem alguma atenção a eles. Creio que devemos nos perguntar: como seria o Brasil num eventual período de Michel Temer (PMDB) à frente do governo, caso a vitoriosa em outubro seja Dilma Rousseff? Terá o atual presidente da Câmara dos Deputados histórico suficiente, maturidade e capacidade política para tal empreitada?

E se, ao contrário, Serra ganhar, terá o jovem deputado carioca Índio da Costa (DEM), seu candidato a vice – que vem, na campanha demotucana, assumindo o papel de agente provocador – equilíbrio necessário para exercer o principal cargo da república brasileira? E o empresário Guilherme Leal, dono da Natura e neófito em política, vice de Marina Silva, estará preparado para a tarefa, uma vez que, ao contrário dos sonhos neoliberais, o governo não é uma empresa capitalista, nem deve ser gerido como tal? Qual deles é o mais indicado?

Perguntas semelhantes devemos nos fazer nas eleições para o governo do estado e, daqui a dois anos, na eleição municipal. O candidato a vice não pode ser figura decorativa e sem capacidade política. Na nossa tradição republicana, ele assume o governo – federal, estadual ou municipal – em casos de ausência ou impedimento do titular. A responsabilidade é grande e o eleitor deve refletir sobre isso.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 26/07/2010)

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Anticomunismo canalha

Por João José de Oliveira Negrão

A campanha de José Serra – ex-presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes), perseguido pelos mentores do golpe militar de 1964 –, na falta de discurso, começa a apelar para o que há de pior na tradição conservadora e de direita da política brasileira: o anticomunismo. Este, de tipo fascista e reacionário, conforme o Dicionário de Política, de Norberto Bobbio, “se traduz na sistemática repressão da oposição comunista, e tem por norma tachar de comunismo qualquer oposição de base popular”.

É triste para os democratas deste país, de diferentes partidos, ver que a campanha do PSDB – partido que agrega muitos dos que lutaram contra a ditadura – assumir este tom. Ontem, a Folha de S. Paulo trouxe que o candidato a vice na chapa tucana, o deputado carioca Índio da Costa, do DEM (ex-PFL), afirmou no site Mobiliza PSDB que o PT é “ligado às Farc, ao narcotráfico e ao que há de pior”. Ele também “acusou” a candidata Dilma Rousseff de ser “ateia”. Os tucanos com alguma memória hão de lembrar que a mesma “acusação” foi feita contra o então candidato a prefeito de São Paulo, Fernando Henrique Cardoso.

Mas não ficou só nisso. O próprio Serra, dias atrás, resgatou uma expressão típica do udenismo, uma indefinida "república sindicalista", a mesma que serviu de mote para o golpe contra Jango em 1964. Ele está perto de, como Carlos Lacerda, principal líder udenista de então, em relação a Getúlio Vargas, em 1950, afirmar: ''Getúlio não pode ser candidato. Se for candidato, não pode ganhar. Se ganhar, não pode tomar posse. Se tomar posse, não pode governar. Se governar, tem de ser deposto''. Substitua-se Carlos Lacerda por Serra e Getúlio por Dilma e veremos que a situação é muito semelhante.

João José de Oliveira Negrão é jornalista, doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp
(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 19/07/10 com título modificado pela redação para Anticomunismo)

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Comissão aprova PEC do diploma e projeto irá a plenário

Por Izabela Vasconcelos, do Comunique-se
14/07/2010

A Proposta de Emenda Constitucional (PEC 386/09) que restabelece a exigência do diploma de Jornalismo para o exercício da profissão foi aprovada nesta quarta-feira (14/07), pela comissão especial da Câmara dos Deputados. Agora, o projeto segue para o plenário, onde deverá passar por dois turnos de votação antes de ir para o Senado.

A PEC é de autoria do deputado Paulo Pimenta (PT-RS), mas o texto aprovado foi o substitutivo do relator, deputado Hugo Leal (PSC-RJ), que tentou harmonizar a exigência do diploma com a visão do Supremo Tribunal Federal (STF), de que a obrigatoriedade fere a liberdade de expressão.

A expectativa é que até o final deste ano a PEC seja aprovada em plenário. “Com certeza, os dois turnos devem acontecer até o final do ano. Mas concluir o semestre com a comissão especial é a nossa vitória principal até agora”, afirmou Pimenta.

(www.comuniquese.com.br)

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Serra e controle da imprensa

Por João José de Oliveira Negrão

Frequentemente, o governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva é acusado de querer controlar a imprensa. As entidades que agregam as grandes empresas do setor, como a ANJ (Associação Nacional dos Jornais), Abert (Associação Nacional das Emissoras de Rádio e Televisão) e a ANER (Associação Nacional dos Editores de Revistas) – as mesmas que apoiam a desregulamentação da profissão de jornalista – vivem a alardear as “ameaças” à liberdade de expressão, principalmente depois da realização da I Confecom (Conferência Nacional de Comunicação), que debateu temas como pluralidade e participação social nas concessões de canais de rádio e TV.

Essas mesmas entidades, até agora (estou fechando este artigo na manhã de domingo), no entanto, não se manifestaram a respeito do controle de fato exercido pelo governo tucano de São Paulo e pelo candidato José Serra – o preferido delas -- na TV Cultura, pretenso canal “público” do nosso estado. O conhecido jornalista Heródoto Barbeiro foi afastado da condução do programa de entrevistas Roda Viva depois de fazer perguntas “incômodas” a Serra sobre os pedágios em São Paulo. Ele será substituído por Marília Gabriela que, ao mesmo tempo que comandará o Roda Viva, na Cultura, manterá outro programa de entrevistas no SBT.

O mesmo assunto custou o cargo do Diretor de Jornalismo da TV Cultura, Gabriel Priolli – com muitos anos de casa, mas que ficou apenas uma semana na direção. Ele ousou mandar produzir uma matéria sobre pedágios, onde ouviu Aloizio Mercadante e também o candidato tucano Geraldo Alckmin. Priolli caiu e a matéria não foi ao ar.

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 12/07/10, com título alterado pela redação para Serra e imprensa)

terça-feira, 6 de julho de 2010

Serra bate cabeça

Por João José de Oliveira Negrão

O candidato presidencial tucano anunciou o nome de seu vice, já às portas do encerramento do prazo. Após tantas tentativas – todas rechaçadas – de fechar o cargo com o governador mineiro Aécio Neves, o candidato escolhido foi o também tucano senador Álvaro Dias, do Paraná. O PPS, como sempre, aceitou logo a escolha. O mesmo aconteceu com o PTB, de Roberto Jefferson.

Mas o tradicional aliado tucano, o DEM (ex-PFL) está se sentindo traído: foi o último a saber da escolha de Dias, feita à revelia das lideranças dos autointitulados Democratas. E o partido pode sair da sombra do PSDB e disputar com ele o espaço da oposição conservadora no Brasil. Ao portal IG, o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) declarou que não faria sentido para seu partido estar coligado com o PSDB sem ter a vaga de vice. “Se eles não querem estar com o DEM, não há motivo para o DEM ficar com eles”, disse. “Não queremos ficar só com o ônus da aliança, ainda mais hoje que a candidatura não é nenhuma Ferrari”, afirmou Torres, referindo-se à queda de Serra e à subida de Dilma Rousseff nas pesquisas de intenção de votos.

Analistas também não entendem a escolha. Álvaro Dias é da região sul, única onde Serra mostra uma pequena vantagem sobre Dilma. E mesmo no Paraná, Dias não retirará da candidata do PT um palanque muito forte, pois ela contará com o apoio do governador Roberto Requião (PMDB).

A oposição está batendo cabeça e sem discurso. Autoproclamado “experiente” em política, Serra está cometendo um erro grave, pois Dias não acrescenta absolutamente nada à chapa oposicionista. E ainda põe em risco a aliança histórica com os Democratas. O PT está rindo à toa.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp
(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 28/6/2010)

Jornalismo, pluralidade e democracia

Por João José de Oliveira Negrão

A modernidade construiu uma relação simbiótica entre democracia e imprensa livre e independente. O jornalismo que poderíamos chamar de pré-capitalista, com seus jornais e suas pequenas gráficas, desde que nasceu viu-se constrangido pelas tentativas de controle e de censura, quer por parte do Estado, quer por parte da Igreja. No Brasil, as diferentes ditaduras, do Estado Novo, do golpe militar, sempre quiseram controlar a imprensa.

Hoje, o cenário é outro. Quem ameaça a imprensa livre e a democracia, tanto quanto os regimes de força, são os superconglomerados controladores dos veículos de comunicação. Estes oligopólios, no Brasil e no mundo, operam contra a pluralidade e transformaram-se num nicho de poder político e econômico opaco, quase impenetrável aos controles cruzados que a democracia contemporânea veio construindo ao longo de sua história.

Que ninguém pense que este fenômeno só acontece nas capitais e grandes metrópoles. O interior do estado de SP, por exemplo, vê consolidarem-se grupos midiáticos proprietários de jornais, rádios, canais de TV, portais, etc. Isso, sem dúvida, acua a pluralidade. O oligopólio, por definição, é antiplural. Neste cenário, é importante que um jornal como o Diário de Sorocaba chegue aos 52 anos, embora sobrevivendo com dificuldades.

Há, como sempre ocorre na história, contratendências fortes a este movimento. Os jornalões vivem uma crise, que se agrava mesmo em países como o Brasil, onde há um sólido crescimento da economia. Nossos grandes jornais nacionais têm, hoje, uma tiragem bem menor que há 20 ou 30 anos. E se é verdade que podemos creditar parte significativa desta fuga de leitores a novos meios, especialmente a internet, é inegável que há também uma crise de credibilidade.

Os jornais impressos estão frente a um dilema histórico: ou mudam, ou perdem completamente sua funcionalidade. Ninguém precisa mais do jornal para ter acesso à informação bruta, à notícia. Ela vem em enxurrada pela internet, pelo rádio, pela TV. No entanto, estes meios – se ganham em velocidade de informação – pela sua própria rapidez, são pouco afeitos à análise mais profunda, à correlação dos fatos, que efetivamente é capaz de produzir conhecimento. É aí, neste espaço, que os jornais impressos podem ser funcionais.

Outra possibilidade de sobrevida para o jornal impresso são os veículos diários gratuitos, de formato pequeno e leitura rápida, com distribuição de mão em mão, experiência já amadurecida na Europa e trazida para a cidade de São Paulo há alguns anos pelos jornais Destak e Metro. Penso que Sorocaba e região têm solidez econômica e cultural para um jornal deste tipo, ainda mais se aliado a um título com o peso da tradição, como o Diário de Sorocaba. Fica a sugestão.
João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor do Ceunsp
(Publicado no Diário de Sorocaba de 06/7/2010)

Eleição também é legislativa

Por João José de Oliveira Negrão

Dentro de dois dias começa formalmente a campanha eleitoral deste ano. Partidos, candidatos e coligações agilizam os últimos detalhes para a disputa do voto dos cidadãos. As pesquisas de intenções de votos presidenciais já começam a povoar as conversas, ao lado dos debates sobre os favoritos a levar a Copa do Mundo. Quem vota em Dilma Rousseff? Quem prefere José Serra? Quem escolhe Marina Silva? Quem subiu e quem desceu nas pesquisas? E quem acredita nelas?

Mas há aspectos fundamentais que acabam ganhando menos destaque do que merecem, seja por parte da mídia, seja nas conversas diárias. Refiro-me às escolhas ao poder legislativo, à eleição para senadores, deputados federais e deputados estaduais, cujo debate acaba ficando em plano muito inferior às candidaturas presidenciais. Mesmo a escolha dos governadores tem sido abafada por este debate.

No entanto, seja quem for o presidente (ou presidenta) eleito, ele vai depender do Congresso para levar adiante suas propostas e projetos. Se o eleito não tiver maioria consistente, vai continuar dependendo de negociações exaustivas com bancadas parlamentares, muitas vezes de partidos com baixa representatividade e que não necessariamente priorizam o interesse público. Por isso, precisamos com urgência de uma reforma política, que solidifique a representação partidária coletiva e dependa menos de caciques regionais ou de grupos de recorte extrapolítico.

Enquanto isso não vem, recomendo aos eleitores que, ao votarem para deputados e senadores, vinculem este voto às coligações políticas que sustentarão seus candidatos a governador e a presidente.
João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp
(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 05/7/2010)

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Ética no dia a dia

Por João José de Oliveira Negrão

A campanha eleitoral formal está para começar. Certamente voltará forte ao cenário a discussão sobre a ética da política e dos políticos, reforçada, agora, pela aprovação de lei da Ficha Limpa. É importante que isso aconteça pois, mesmo que num futuro breve venha a tão sonhada reforma política, o grande juiz, nas democracias, são os eleitores.

Mas a volta do debate ético ao centro das atenções pode ser um momento de reflexão sobre as nossas práticas éticas individuais. Será que cada um de nós exerce o modelo ético que cobra dos outros? Quantos de nós – no exercício de um pequeno poder, o menor que seja, dentro da empresa, dentro de casa, nas redações e nas universidades –, coloca o comportamento ético como uma das prioridades? Quantos de nós têm justificativas éticas a posteriori para atos não muito transparentes, como se a ética fosse moda pret-a-porter, utilitária, a ser usada conforme a necessidade do momento? Quantos de nós, nestes pequenos poderes, não manipulou de acordo com nossos próprios interesses certas situações que pediam transparência de atos?

A ética, então, deve sim ser cobrada do outro, mas também de nós mesmos. Estaremos preparados?

P.S. Estou chegando aos 150 artigos publicados neste espaço. Numa rápida amostragem, com os últimos 50 deles, 36% trataram de Política; 28% de Jornalismo; 16% de Economia e 20% de outros temas. Agradeço ao jornal e aos leitores, especialmente àqueles que elogiam ou criticam as posições e análises que apresento.

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 14/06/10, com o título modificado pela redação: Dia-a-dia e a campanha)

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Nacionalismo tosco

Por João José de Oliveira Negrão

O técnico Dunga, em seguidas entrevistas mal educadas, tem destacado um pretenso nacionalismo, um “quem não está comigo é inimigo da pátria”, que não aceita críticas e transforma o mundo num maniqueismo tosco do nós contra eles. É como se o futebol – um esporte emocionante, de rara beleza plástica – fosse mais que isso e virasse um quase cenário de guerra, cheio de inimigos, espiões e traidores.

A questão nacional, no Brasil e na América do Sul, tem uma dupla face: tanto justificou ditaduras militares de direita contra o inimigo “interno”, movido por ideologias “exóticas” e “estranhas à cultura ocidental e cristã”, quanto motivou movimentos populares e progressistas de libertação nacional. O nacionalismo excludente de Dunga parece mais próximo ao dos militares da linha dura, embora o futebol seja uma das nossas mais legítimas manifestações de cultura popular.

O mau humor permanente do técnico, sua grosseria em cumprimentar o Presidente da República – que, na democracia, pode ser criticado, pode ter opositores – com a mão no bolso e com ar de enfado, mais do que falta de educação, revela um despreparo para a convivência civilizada. Ninguém que reclamou da não convocação de Ganso, Neymar e Hernanes é menos brasileiro que Dunga.

Decidir quem é ou não patriota é outra das competências que Dunga não tem.

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 07/6/2010)