segunda-feira, 7 de junho de 2010

Nacionalismo tosco

Por João José de Oliveira Negrão

O técnico Dunga, em seguidas entrevistas mal educadas, tem destacado um pretenso nacionalismo, um “quem não está comigo é inimigo da pátria”, que não aceita críticas e transforma o mundo num maniqueismo tosco do nós contra eles. É como se o futebol – um esporte emocionante, de rara beleza plástica – fosse mais que isso e virasse um quase cenário de guerra, cheio de inimigos, espiões e traidores.

A questão nacional, no Brasil e na América do Sul, tem uma dupla face: tanto justificou ditaduras militares de direita contra o inimigo “interno”, movido por ideologias “exóticas” e “estranhas à cultura ocidental e cristã”, quanto motivou movimentos populares e progressistas de libertação nacional. O nacionalismo excludente de Dunga parece mais próximo ao dos militares da linha dura, embora o futebol seja uma das nossas mais legítimas manifestações de cultura popular.

O mau humor permanente do técnico, sua grosseria em cumprimentar o Presidente da República – que, na democracia, pode ser criticado, pode ter opositores – com a mão no bolso e com ar de enfado, mais do que falta de educação, revela um despreparo para a convivência civilizada. Ninguém que reclamou da não convocação de Ganso, Neymar e Hernanes é menos brasileiro que Dunga.

Decidir quem é ou não patriota é outra das competências que Dunga não tem.

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 07/6/2010)

3 comentários:

Felipe Rocha Shikama disse...

Olá, João. bacana o artigo.
Me lembro de outras Copas (na verdade de quatro que assisti, ganhei duas, rs)e percebo que naquela época o sentimento de pertencimento à nação, às vesperas do mundial, era mais intenso do que hoje. Não sei se é apenas impressao minha, mas era muito mais comum, frequente, ver ruas pintadas de verde e amarelo, carros e janelas decoradas com os motivos da seleção... Creio que essa nocao de pertencimento, de identidade nacional, como diria o Stuart Hall, tenha enfraquecido no Brasil - nao por conta apenas da antipatia de Dunga e suas duvidosas escolhas na composição do time - mas justamente porque o país vai bem. A renda das famílias aumentou, o desemprego diminuiu...
Veja, os paises onde o futebol mais aprece hoje como "unificador" de corações e mente, de uma identidade nacional, são africanos que, a gente sabe, foram forjados em Estados-Nação por seus colonizadores, ignorando violentamente outros processos identificatórios como as tribos, as crenças, os dialetos...
Creio que o apelo da selecao diante a população, sobretudo na Copa do Mundo, teve mais força no Brasil nos momentos de crise - quando o país, apenas por meio do esporte, se mostrava capaz de superar a "síndrome do cachorro vira-lata".

leandro sarubo disse...

Maravilhosa sua coluna, professor.

Anderson Oliveira disse...

"tem destacado um pretenso nacionalismo, um “quem não está comigo é inimigo da pátria”, que não aceita críticas e transforma o mundo num maniqueismo tosco do nós contra eles"

O trecho acima me trouxe outra coisa à mente. Uma certa plataforma de campanha.