terça-feira, 21 de junho de 2011

Esquerdas e democracia

Por João José de Oliveira Negrão

Àgnes Heller, filósofa húngara, discípula de Lucáks, afirma, num artigo chamado “Democracia formal e democracia socialista”, publicado no Brasil em 1980, que a democracia formal pode tanto ser a base de uma sociedade capitalista quanto de uma sociedade socialista. Entretanto, adverte, "esse caráter formal não deve ser confundido com o aspecto ilusório ou não autêntico que alguns quiseram lhe atribuir. Ao contrário, a democracia formal representa uma inovação muito importante, que permite assegurar a permanência do caráter democrático de um Estado, do qual ela é a primeira condição indispensável".

Carlos Nelson Coutinho, nessa mesma linha, afirma, no importante livro “A democracia como valor universal”, que "é verdade que muitas liberdades democráticas em sua forma moderna (o princípio da soberania popular, o reconhecimento legal do pluralismo etc.) têm nas revoluções burguesas, ou, mais precisamente, nos amplos movimentos populares que terminaram (mais ou menos involuntariamente) por abrir o espaço político necessário à consolidação e reprodução da economia capitalista, as condições históricas da sua gênese; mas é igualmente verdade que, para o materialismo histórico, não existe identidade mecânica entre gênese e validade".

Mas a democracia não é isenta de problemas. O pensador italiano Norberto Bobbio levanta alguns deles: sobrevivência de oligarquias, do poder invisível e da razão de Estado, sem contar as promessas não cumpridas do ideal democrático, como a educação dos cidadãos e a ampliação dos espaços políticos.

Aceitar a democracia como "regra do jogo" significa, fundamentalmente, acreditar que o socialismo é uma possibilidade e não uma realidade histórica inelutável, inscrita não se sabe por quem no vir a ser da humanidade. Significa também ter em conta as várias possibilidades componentes, num momento histórico determinado, do processo de luta política.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 13/06/2011)

Um comentário:

Anderson Oliveira disse...

Aceitar a democracia como "regra do jogo" significa abrigar socialistas e capitalistas num mesmo barco. Não obstante, o capitalismo aceita sua negação, como demonstra Schumpeter. Já no socialismo, o capitalismo deve ser descartado.