segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Sobre o senso comum

Por João José de Oliveira Negrão

Viver na Europa durante a Idade Média pode ter sido muito mais simples que nos dias atuais. Afinal, o lugar das pessoas e das coisas estava determinado e não havia o que indagar. Se a vontade divina havia me colocado numa casa nobre, aí residia a minha posição, confortável e cheia de privilégios. Do contrário, os campos para serem trabalhados, as oficinas de artesanato ou, quem sabe, a sorte de pertencer ao baixo clero, eram destinos certos. Praticamente não havia conflitos sobre a própria existência e como ela se dava, já que predominava o pensamento cristão medieval, endossando este modelo de sociedade.
 
A certeza prevalecia, e não a dúvida.
 
No século XVII surge o chamado conhecimento científico, que obviamente não é o inventor da dúvida. A filosofia é conhecida desde o período clássico, mas o pensamento científico sistematiza, através de seus métodos, um contraponto ao senso comum.
Segundo Solis, “o senso comum caracteriza-se como um conjunto desagregado de ideias e opiniões difusas e dispersas que fazem parte de um pensamento genérico de uma época ou de um certo ambiente popular”.
 
Pode-se afirmar que este conhecimento comum, construído a partir de vivências e experiências, é a nossa zona de conforto, origem de muitas explicações, das obviedades. É o saber que não desestabiliza, não traz em seu bojo a dúvida, mas a certeza.
 
Segundo Gramsci, “somos todos conformistas de algum conformismo”. Não escapamos do senso comum, que não pode ser separado da filosofia, por possuir em seu bojo algo que se aproxima dela: o bom senso. Este traz, em si, o início de uma criticidade, que nos liberta dos impulsos instintivos e violentos.
 
Assim, o senso comum não é algo a ser desprezado, mesmo porque nos utilizamos dele para boa parte do nosso estar no mundo. Partimos do senso comum para iniciar uma pesquisa ou reflexão que nos conduzirá para uma criticidade dos fatos e objetos, desvelando as questões ali contidas.
 
Resgatar a importância da criticidade, da dúvida perante as verdades contidas em nosso cotidiano é não apenas uma tarefa para os acadêmicos, ou intelectuais, mas a necessidade de uma ação permanente de todos.

João José de Oliveira Negrão é jornalista,
doutor em Ciências Sociais e professor no Ceunsp

(Publicado no Bom Dia Sorocaba de 30 de janeiro de 2012)

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